Vida Celebrativa - Ano Eclesiástico


ID: 2654

A Páscoa e o Kinder Ovo

09/04/2009

Parecia um ovo, um grande ovo verde colocado no meio de uma cesta de frutas. Quando o balançávamos, podíamos ouvir o barulho de alguma coisa que havia dentro dele. Por causa disto e aproveitando a proximidade da Páscoa, imaginei que era um Kinder Ovo de abacate.

Quando, por pura diversão, disse isso ao meu filho caçula, seus olhos brilharam e sua imaginação levou-o a pensar que o abacate que esperávamos amadurecer continha mesmo uma surpresa no seu interior, uma surpresa doce ou divertida como acontece com um Kinder Ovo.

O filho mais velho, já mais afastado da idade de acreditar em tudo o que seu pai ou sua mãe lhe dizem, ficou cético, porém, ainda assim, não deixou de acompanhar o desenrolar dos acontecimentos. Afinal, se houvesse mesmo uma surpresa, não queria perder a oportunidade de partilhá-la.

Um dia o abacate amadureceu. E lá fomos nós para a cozinha. Um par de olhos de menino, atento e cheio de esperança e curiosidade, observava cada movimento em torno do Kinder Ovo. Mais afastado, e vendo com o canto do olho, sem interesse mas interessado, outros olhos de menino esperavam sem esperar que o abacate revelasse sua real natureza, sem surpresas nem encantos.

E foi, afinal, o que aconteceu. Criada a expectativa, parti ao meio a fruta e de dentro dela saltou apenas aquilo que lá deveria estar: um caroço arredondado e cinzento como o de qualquer abacate.

A pequena frustração inicial do menino capaz de imaginar um abacate Kinder Ovo não foi suficiente para tirar-lhe o apetite, e a fruta preparada com limão e açúcar foi consumida até a última colherada.

Lá, na minha imaginação, porém, o abacate continuou alimentando histórias. Pensei no caroço, semente de abacateiro e promessa de nova árvore e de novos frutos, que se entrega à violência da terra para completar a esperança de ser árvore nova. Pensei no seu sacrifício para trazer à vida ramos novos e expectativa de frutos bons. E pensei nas crianças que se alimentam de sonhos e de imaginação e nos adultos como eu que já não se deixam surpreender tanto assim por um Kinder Ovo de abacate.

Pensei na Páscoa, esta experiência de libertação pela qual sempre desejo passar novamente, de vida que ressurge vencendo a morte e de nascimento de um novo tempo em que as fomes de justiça estarão saciadas. E pensei na Páscoa nos templos de consumo, nos ovos de chocolate, nos coelhos e nas promessas de felicidade que o dinheiro pode alcançar.

E é mais um abacate amadurecendo com seu caroço. Regularidade das regularidades, rotina das rotinas, até mesmo a libertação e a esperança viraram mercadorias. Não precisa de imaginação, nem de fé. Apenas uma pequena entrada e o paraíso se abre para os negócios de quem acredita.

Mas é Páscoa e tudo é possível. Um menino e seu pai podem ver um Kinder Ovo num abacate. E podem ver no abacate o abacateiro e no abacateiro os novos frutos. É Páscoa e um abacate pode ser apenas mais um abacate como a história da Páscoa de Jesus ser apenas mais uma história bem contada, sem surpresas nem encanto. No entanto, também pode ser o lugar em que se encontra a semente da liberdade, doce e alegre, que vem da experiência de libertação. O que, para um coração menino, é muito mais do que os olhos podem ver.

Ricardo Fiegenbaum, 2009


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