Vida Celebrativa - Ano Eclesiástico


ID: 2654

1 Coríntios 15.1-11

Auxílio Homilético

19/04/1992

Prédica: 1 Coríntios 15.1-11
Leituras: Êxodo 15.1-11 e Lucas 24.1-11 (12)
Autor: Nélio Schneider
Data Litúrgica: Domingo da Páscoa
Data da Pregação: 19/04/1992
Proclamar Libertação - Volume: XVII


O amor de Deus tornou-se a morte da morte e a vida do ser humano.
Dietrich Bonhoeffer

1. Introdução

Desde o Natal acompanhamos Jesus (liturgicamente) em seu crescimento e em sua caminhada pela Palestina, subimos com ele a Jerusalém nas semanas de quaresma, presenciamos e experimentamos o repartir do pão e do vinho, o partir da vida em favor de nós na cruz. Chegamos, agora, à culminância desta caminhada litúrgica, ao fato completamente inesperado, novo. É um fato que não vimos e não presenciamos. Somos chamados a crer sem ver (Hb 11.1). Deus nos convoca a viver um paradoxo: exatamente o motivo de nossa maior esperança e alegria — a vitória da vida —, não admite pergunta por provas ou exigência de garantias. O mais importante só podemos crer, atirar-nos no abismo escuro, confiando que o pai irá nos aparar. Somos chamados à certeza daquilo que não se pode ver, nem apalpar, nem comprar. Acreditar na Páscoa é ousar/arriscar tudo na promessa de Deus transmiti¬da a nós pelos apóstolos.

2. Considerações exegéticas

l Co 15 aborda o tema da ressurreição dos mortos e, por extensão, a ressurreição de Jesus Cristo. Como nos capítulos precedentes da primeira carta de Paulo aos Coríntios (caps. 7; 8-10; 11; 12-14), também aqui trata-se de mal-entendidos que surgiram na comunidade quanto à proclamação do evangelho por parte do apóstolo Paulo. Faz-se necessário precisar e aprofundar a questão em pauta.

Qual era o mal-entendido dos coríntios neste caso? O v. 21 dá a resposta: Alguns de vocês dizem que não há ressurreição de mortos. Tratava-se mais precisamente de uma dificuldade em relação à dimensão histórica, corporal da ressurreição. Não se trata da dúvida filosófica grega acerca da possibilidade real da ressurreição. Aqui temos a ver com um estreitamento entusiástico, docético da concepção da ressurreição. Esta se torna imanente e diz respeito tão somente à realidade dos não-mortos, isto é, dos agora vivos; refere-se tão-somente ao momento presente (compare v. 19: Se a nossa esperança em Cristo é somente para esta vida... e v. 32: Comamos e bebamos...). Os coríntios tinham entendido que o Cristo ressurreto os tinha libertado para gozar a vida no momento presente. Faltava-lhes a dimensão do Jesus morto na cruz. Na sua visão docética não conseguiam identificar o Jesus morto com o Cristo ressurreto. Essa visão imanente da ressurreição implicava, de fato, em dizer que Jesus não podia ter ressuscitado, tornando Paulo e sua mensagem mentirosos e a fé/esperança dos coríntios uma ilusão (vv. 12ss.).

Como Paulo enfrenta o mal-entendido dos coríntios? O apóstolo repete o que já havia dito à comunidade, ele reafirma o fundamento, a saber, aquela tradição de fé que ele mesmo havia recebido e passado aos coríntios por ocasião de sua primeira estada entre eles (vv. l-3a). Paulo escreve com todas as letras aquele credo cristológico fundamental — um dos mais antigos que conhecemos (remonta à meta de dos anos 30 d.C.) — composto pelas duas afirmações cristológicas básicas:

1 — que Cristo morreu por nossos pecados (segundo as escrituras); e como sinal disto: que foi sepultado;

2 — que ressuscitou ao terceiro dia (segundo as escrituras); e como sinal disto: que foi visto. A identidade do morto com o ressurreto é fundamental. Cristo morreu e ressuscitou. O fato de ter sido visto ressuscitado por seus apóstolos e muitas pessoas — também por Paulo — é importante para confirmar a autoridade do testemunho da ressurreição.

Os vv. 9-10 são um parêntesis, no qual Paulo explica a sua situação pessoal, alinhando-se entre as testemunhas da ressurreição a despeito de sua história pessoal como ex-perseguidor exatamente da fé que agora prega. Tanto maior foi o milagre da graça de Deus que lhe abriu os olhos e lhe deu o privilégio de participar proficuamente de sua obra.

No v. 11 Paulo retoma o início e resume: todos os enviados pregaram a mes¬ma coisa a respeito da ressurreição, o que os coríntios também aceitaram pela fé. Tanto menos se entende como poderiam alguns tirar consequências tão estranhas co¬mo as acima mencionadas. A partir do v. 12 Paulo entra no mérito desta questão.

(Para aprofundamento da exegese compare o trabalho de U. Schoenborn em PL, vol. III, pp. 17-30).

O que Paulo faz é um chamado à reflexão, à consideração lógica baseada no anúncio feito anteriormente. Ele procede argumentativamente, tentando abrir o horizonte de um estreitamento imanentista. A ressurreição de Cristo — de amplitude cósmica — havia sido reduzida em sua consequência à vida aqui e agora, o que resultava em valores éticos dúbios. A vida/ressurreição havia sido separada da morte/sofrimento. Estes não foram vencidos por aqueles.
Vida/ressurreição ficam restritas ao âmbito da morte e do sofrimento. Assim não se teria aberto, de fato, nenhuma perspectiva nova de vida; estaríamos sem esperança como antes. Diante disso Paulo acha necessário reafirmar o credo da fé e da esperança, que coloca novamente cada um diante da decisão de crer ou duvidar. A intenção do apóstolo é clara: é chamar à f é e à confiança inabalável no testemunho das escrituras e dos apóstolos. A fé do leitor deve basear-se na palavra do credo e no aval das testemunhas.

3. Meditação

Para nós, que desde sempre aprendemos a viver na perspectiva do momento presente, é uma grande dificuldade organizar a vida com base naquilo que não podemos ver, sentir, segurar, comprar, garantir. A perspectiva de nossa vida é de curto prazo, egocêntrica e consumista. Deus pede de nós uma perspectiva de eternidade, voltada ao próximo e doadora de vida. E agora, que passo dar?

A proposta de Deus deve ficar clara: ele pede de nós que acreditemos na ressurreição e nos preparemos para ela. Ele nos pede, com isso, que nos doemos como Cristo se doou e nos ponhamos a caminho sem ver adiante, a exemplo de Cristo.

Acreditar na ressurreição é deixar-se guiar por uma perspectiva encoberta aos nossos olhos. É por-se a caminho tal qual Abraão, apenas baseado na palavra de Deus; é caminhar em direção ao Mar Vermelho, como os israelitas, mesmo não vendo as águas se abrirem para lhes dar passagem; é louvar a Deus pela libertação, mesmo que se tenha ainda o deserto pela frente (ÊX 15); é entrar no deserto mesmo sem ter as fotos da terra prometida para mostrar como prova; é aceitar as palavras de Maria Madalena, Joana, Maria e das outras mulheres que foram ao sepulcro na manhã da páscoa, sem desqualificá-las como boato (Lc 24.9ss.); é acreditar na mensagem do anjo: Ele não está aqui; ressuscitou! (Lc 24.6), sem querer pôr o dedo nas feridas de Jesus.

Crer na ressurreição é saber das estruturas de morte do nosso tempo derrotadas, apesar de senti-las ainda com vida e vigor; é confiar que, repartindo e doando a vida — a exemplo de Cristo — ganhar-se-á a vida plena.

4. Impulsos para a prédica

Eu afirmo a vocês que, se o grão de trigo, lançado na terra, não morrer, ele continuará a ser apenas um grão. Mas, se morrer, dará muito trigo. Quem ama a sua vida não vai perdê-la; mas quem não se apega à vida neste mundo, vai conservá-la para a vida eterna. Quem quiser me servir, siga-me. (Jo 12.24-26a.)

O milagre da ressurreição de Cristo desmonta a idolatria da morte que impera entre nós... Nada torna a idolatria da morte tão patente como quando uma época reclama estar construindo para a eternidade e, no entanto, nela a vida não vale nada, ou quando se fala muito alto acerca do homem novo, do mundo novo, da sociedade nova que surgirá disto, porém esta novidade consiste apenas na destruição da vida pre-sente. (D. Bonhoeffer.)


Confissão da esperança


Cremos em Deus:
aos que penavam sob a lei ele deu amor;
aos estrangeiros na terra ele deu um lar;
às vítimas dos ladrões ele deu seu auxílio.
Cremos em Jesus Cristo, o Filho de Deus, nosso irmão e Salvador:
aos famintos ele deu de comer;
aos que viviam no escuro ele deu a luz;
aos que estavam na prisão ele deu a liberdade.
Cremos no Espírito Santo:
aos desesperados ele dá novo ânimo;
aos que vivem na mentira ele dá a verdade;
aos que experimentam os terrores da morte ele dá
esperança de vida.
Tenham entre vocês o mesmo modo de agir que Cristo teve
. (Fp 2.5)
E. Cardenal


Autor(a): Nélio Schneider
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo da Páscoa
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Natureza do Domingo: Páscoa

Testamento: Novo / Livro: Coríntios I / Capitulo: 15 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 11
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1991 / Volume: 17
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 13323

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Em todo o universo, não há nada que possa nos separar do amor de Deus, que é nosso por meio de Cristo Jesus, o nosso Senhor.
Romanos 8.39
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O verdadeiro cristão não vive na terra para si próprio, mas para o próximo e lhe serve.
Martim Lutero
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