Quaresma - Tríduo Pascal - Tempo Pascal



ID: 2656

Hebreus 5.5-10

Auxílio Homilético

18/03/2018

 

Prédica: Hebreus 5.5-10
Leituras: Jeremias 31.31-34 e João 12.20-33
Autoria: Geraldo Grützmann
Data Litúrgica: 5º. Domingo na Quaresma
Data da Pregação: 18/03/2018
Proclamar Libertação - Volume: XLII

Exercitando a obediência no sofrimento

1. Introdução

Com o 5° Domingo na Quaresma estamos nos aproximando do ápice da história da Paixão de Jesus. Na leitura do profeta Jeremias é anunciada a nova aliança que Deus fará com o seu povo. Nesse novo tempo, a lei vai tocar o coração das pessoas e o perdão será dado definitivamente. O Evangelho de João descreve o cenário onde o desenrolar da história acontece. Motivado pela procura de alguns gregos, Jesus anuncia novamente a sua morte. Fala da necessidade de decisão para obter a vida em abundância. Nas suas palavras transparece o momento de confronto e angústia. Agora, está angustiada a minha alma, que direi eu? (Jo 12.27). A Carta aos Hebreus apresenta Jesus como o sumo sacerdote. Jesus é o sumo sacerdote definitivo, pois foi integralmente obediente a Deus. Através da sua entrega ele nos oferece a salvação.

2 Exegese

v. 5: Assim, também Cristo a si mesmo não se glorificou para se tornar sumo sacerdote, mas o glorificou aquele que lhe disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei; 

A Carta aos Hebreus faz uso da tradição sacerdotal do povo de Israel para destacar aspectos importantes no sacerdócio de Jesus. Cabem a Deus a vocação e instituição de um sacerdote (Êx 28.1, Nm 3.10). É a escolha de Deus que lhe dá legitimidade e responsabilidade. Na perspectiva da antiga aliança era assim. Jesus é apresentado como aquele que preencheu esse requisito em toda a sua abrangência. Jesus não se fez sumo sacerdote. É Deus, o Pai, que o eleva à condição de filho. A glorificação consiste exatamente nisto: o Pai constituiu Jesus para servir como verdadeiro sumo sacerdote.

v. 6: como em outro lugar também diz: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.

Quando pensamos em sacerdotes do Antigo Testamento, lembramos de Arão e da tribo de Levi. Mas quem era Melquisedeque? Primeiramente, ele era rei na cidade de Salém, no tempo do patriarca Abraão (Gn 14.18), pelo que é reconhecido como “sacerdote do Deus Altíssimo”. Abraão reconhece Melquisedeque como servo do Deus Altíssimo, o mesmo Deus que o mandou sair da sua pátria em busca da terra prometida. Quando Hebreus apresenta Jesus como sendo da ordem de Melquisedeque, aponta para o fato de que esse sacerdócio é alternativo, fora da linhagem do sacerdócio levítico oficial. A vocação vem diretamente de Deus e não está delimitada cronologicamente, mas é para sempre.

v. 7: Ele, Jesus, nos dias da sua carne, tendo oferecido, com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem o podia livrar da morte e tendo sido ouvido por causa da sua piedade,

Hebreus destaca a humanidade de Jesus. No período em que exerceu seu ministério na terra, incluindo o tempo entre a ressurreição e a ascensão, permanece ser humano. Fazia parte do ministério sacerdotal da Antiga Aliança o oferecimento de sacrifícios. Jesus, como sumo sacerdote, assume essa tarefa. Todo o tempo de vida de Jesus aqui nesta terra foi um caminho de sacrifício, executado com muita paixão. Destaca-se, em especial, o acontecimento de Getsêmani e do Gólgota, oração e morte de Jesus (Fp 2.5). Jesus ofereceu orações e súplicas. Em sua oração abdica da sua própria vontade. Ele sabia que sua vida estava nas mãos de Deus e que o Pai era o único que poderia mudar o seu caminho de sofrimento. Mas em sua oração destaca que seja feita a vontade do Pai e não a sua. O caminho de sacrifício não encerra no Getsêmani, mas o leva até a cruz. Lá Jesus morre sob gritos de sofrimento (Mt 27.46-50). A carta descreve o caminho da paixão de Jesus com palavras que destacam a sua humanidade. Mas também no caminho mais difícil que Jesus teve de seguir está presente o brilho da glória divina. Ele foi elevado com base na obediência a Deus. Essa certeza está presente em todas as orações de Jesus. Ele podia orar: Pai, eu te agradeço. Jesus nunca foge do sofrimento e por isso Deus ouve sua oração. Há, porém, uma distinção entre o “ouvir” e o “atender” da súplica de Jesus. Jesus foi ouvido em suas orações. No Getsêmani recebe o apoio do anjo, que lhe faz companhia e o conforta (Lc 22.43). Ele foi fortalecido para o sofrimento e para vencer o medo da morte, mas não para rejeitar a morte.

v. 8: embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu

Jesus foi ouvido em suas orações, mas isso não o libertou da obediência em relação ao Pai. Essa obediência não surgiu do nada, foi aprendida por Jesus,  exercitada em sofrimento. Também o Filho de Deus teve que aprender a obediência, que o levou ao sofrimento até a morte na cruz. Jesus mesmo compreendia seu caminho aqui nesta terra como obediência total.

v. 9: e, tendo sido aperfeiçoado, tornou-se o Autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem,

A perfeição em Jesus é o aprimoramento da ética baseada na justiça e no projeto de Deus. Ele pregou essa ética e, principalmente, a transformou em atitude de vida. Esse aperfeiçoamento não fica sem frutos, é salvação para aqueles que nela acreditam. O posicionamento ético, adotado também no sofrimento, confere a Jesus a autoridade divina para recomendar aos seus discípulos: Aprendam de mim (Mt 11.29). Assim como Jesus teve que ser obediente em relação ao Pai, também é premissa para os filhos de Deus a obediência a Cristo. A carta conscientiza os crentes de que também a comunidade pode se solidificar através do sofrimento e da obediência. Obediência prática significa não recuar no sofrimento, mas permanecer firme na confissão em Jesus Cristo. Somente através do caminho de sofrimento e morte Jesus pode conquistar a nossa salvação. Após a conclusão desse caminho através da sua ressurreição e ascensão, ele se tornou o caminho para a salvação eterna.

v. 10: tendo sido nomeado por Deus sumo sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque.

Com a sua ascensão, Jesus inicia o seu reinado como sumo sacerdote divino. A palavra profética do Antigo Testamento se cum priu. Jesus é sumo sacerdote pela ordem de Melquisedeque. Nas afirmações da Carta aos Hebreus sobre o sacerdócio de Jesus, encontramos um claro crescendo: Jesus é o sumo sacerdote (3.1). Ele é o fiel sumo sacerdote. Ele é o grande sumo sacerdote (4.14). E, finalmente, sumo sacerdote pela ordem de Melquisedeque (5.10).

3. Meditação

Jesus sofreu. Percorreu um caminho amargo e difícil. Os evangelhos nos contam a sua trajetória de vida. Ler esses relatos ainda não significa compreender a dor, o medo e o desespero de Jesus. Só iremos de fato saber do seu significado se passarmos por experiências de vida semelhantes à que Jesus passou. Quando tivermos passado por “momentos de inferno”, será mais fácil sentir o que Jesus e os seus seguidores sentiram. O sofrimento de Jesus não está apenas nas feridas dos espinhos, nos açoites ou na pesada cruz que carregou até o Gólgota. O sofrimento vem também das palavras da multidão, do silêncio ou da fuga dos seus discípulos. E, finalmente, da gozação: Se de fato és filho de Deus, desce da cruz. Jesus não desceu da cruz, mas foi fiel até o fim. Segundo a Carta aos Hebreus, o sofrimento de Jesus não foi em vão, mas se transforma no serviço sacerdotal definitivo. Como nós lidamos com o sofrimento que está presente em nossos dias? Quanto sofrimento absurdo por decisões políticas injustas! Quanto sofrimento por causa dos nossos próprios erros!

Jesus foi obediente. Por que Jesus não mostrou o seu poder e desceu da cruz? Teria sido muito mais fácil para ele. Seria muito mais fácil para nós, cristãos, anunciar um Senhor poderoso ao invés de anunciar o crucificado. Por que teve que ser assim? A Carta aos Hebreus aponta para a obediência. Essa obediência não é um seguimento cego a ordens ou leis. É um processo onde nos tornamos ativos como sacerdotes. Buscamos a Deus e temos o direito de questioná-lo, de suplicar. Tornamo-nos obedientes quando descobrimos, através de Jesus, a verdadeira face de Deus. No exercício da obediência a Deus, descobrimos que sua face não é de força e violência, mas de amor e solidariedade. Faz parte do aprendizado trilhar o caminho do sofrimento. Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê--la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á (Mt 16.25).

Na Carta aos Hebreus vai ficando claro por que Jesus é chamado repetidamente de sumo sacerdote. Como povo de Deus, estamos a caminho e temos saudades de um lugar onde podemos ter paz, onde nossas dúvidas e perguntas encontram respostas. Para o povo de Israel o sonho era a terra de Canaã e o Templo de Jerusalém, onde o sumo sacerdote era o mediador entre Deus e o seu povo amado. Para nós, o alvo e o sonho é o reino de Deus, do qual Cristo se tornou o mediador e o sumo sacerdote. Jesus Cristo é o caminho certo que nos leva ao lugar onde encontramos Deus. Somos desafiados a permanecer firmes na nossa confissão, pois temos um sumo sacerdote, o próprio filho de Deus.

4. Imagens para a prédica

a) Há alguns anos, eu estava participando de uma manifestação na cidade de Rostock. Ali perto, no norte da Alemanha, estava reunido o G8. Os líderes dos países mais ricos do mundo estavam lá para tomar importantes decisões sobre o futuro da humanidade. Era hora do povo ir para a rua e defender projetos e propostas em favor da vida, principalmente nos países mais empobrecidos de nossa terra. No início, eu me senti muito bem caminhando com a multidão e fazendo coro com tantas organizações, mostrando sua força e exigindo direitos. Mas em poucos instantes o cenário mudou. Houve o confronto entre grupos black block e o aparato policial. Na minha frente, carros da polícia sendo tombados e incendiados. Paus e pedras cruzando o ar contra bombas e balas de borracha. A pimenta ardeu nos olhos e imediatamente corri em busca de um lugar mais seguro. Não é assim em nossa vida? Somos obedientes e fiéis às nossas convicções enquanto estamos num espaço protegido. Quando “a coisa aperta”, abandonamos a luta. E como ficam os que não têm para onde correr?

b) No momento em que preparo este subsídio, leio o clamor da colega que expressa sua dor nas redes sociais. Ela perdeu o filho em morte trágica e grita  com três palavras: Dói! Dói! Dói!

Em 25/11/2007, ela havia publicado um poema que fala da dor no momento da perda.

Pedaços...
Despedaça
Um pedaço da vida
De sofrida que é...
Quando um pedaço
De um todo
Sai de todo
Sai de tudo
Fica o todo
Todo em pedaço
Porque um pedaço
Não é mais parte
Não faz mais parte
Nem em parte
Parte o coração!
(Louraini Christmann )

4. Subsídios litúrgicos

Oração de coleta: Deus bondoso e misericordioso, tu falaste em tempos antigos através de sacerdotes e profetas. O teu filho Jesus Cristo veio a este mundo para ser o nosso sumo sacerdote. Ele proclamou um novo tempo com palavras e gestos de amor e solidariedade. Dá que a tua Palavra desperte em nossos corações a obediência ao teu projeto de vida. Que em momentos de sofrimento ela seja como um anjo que nos conforta. Por Jesus Cristo, na unidade do Espírito Santo. Amém.

Sugestão de cantos: HPD 1, 111; HPD 2, 432 e 459.

Bibliografia

LAUBACH, Fritz. Der Brief an die Hebräer. Wuppertal: Brockhaus, 2000.
GOPPELT, Leonhard. Teologia do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal; Petrópolis: Vozes, 1983.


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Autor(a): Geraldo Grützmann
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo da Páscoa
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Natureza do Domingo: Quaresma
Perfil do Domingo: 5º Domingo na Quaresma
Testamento: Novo / Livro: Hebreus / Capitulo: 5 / Versículo Inicial: 5 / Versículo Final: 10
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2017 / Volume: 42
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 50145

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