Estima-se que o planeta tenha, hoje, 7 bilhões de habitantes. A caraterística principal desta população mundial é a diversidade de gênero, etnias e idade. Não somos todos iguais, não vivemos nas mesmas condições nem estamos na mesma fase da vida. Há, assim, uma diversidade de formas de expressar as ideias, a religiosidade, os interesses, as expectativas e os sonhos de vida. Em vários momentos da história da humanidade, essa diversidade humana foi motivo de exclusão, violência e negação de direitos, inclusive dos direitos humanos, àqueles que eram diferentes.
Enquanto os movimentos sociais e os Governos democráticos implantam uma política de inclusão, a Igreja cristã há muito tempo se identifi ca com a prática da inclusão. Basta olhar para as manifestações e práticas de Jesus. A maioria das curas praticadas por Jesus e os confl itos de ordem religiosa e política nos quais se envolve tem em questão a inclusão das pessoas ao seu contexto social e religioso. Jesus se relaciona intimamente com diversas pessoas: crianças, adultos, homens, mulheres, doentes, defi cientes e idosos. O grupo dos seguidores e simpatizantes de Jesus é formado por esta diversidade de pessoas. A atuação pública de Jesus é identifi cada pela inclusão e essa passa a ser a marca das primeiras comunidades cristãs. A inclusão de diferentes pessoas na comunidade de fé começa pelo Batismo. O ato de batizar não diferencia adultos, crianças, homens, mulheres, ricos nem pobres. Em Gálatas 3.27-28, o apóstolo Paulo afi rma que todos que foram batizados em Cristo se revestiram de Cristo. Não há mais diferença entre judeu e grego, entre escravo e homem livre, entre homem e mulher, pois todos são um só em Jesus Cristo.
A atuação pública de Jesus é identificada pela inclusão e essa passa a ser a marca das primeiras comunidades cristãs |
A IECLB, como Igreja cristã em solo brasileiro, carrega consigo o compromisso da prática da inclusão. Nas últimas décadas, a IECLB tem se identifi cado como uma Igreja inclusiva. Em sua agenda de discussões e decisões conciliares, percebem-se o encaminhamento de questões como a inclusão de pessoas com defi ciência, a representatividade por gênero, a preocupação com as crianças e a participação do jovem. Quando afi rma que o objetivo é ‘construir comunidades inclusivas’, isso realmente não é só ‘da boca para fora’. Esta experiência é um testemunho público se comparada com a realidade social, política, cultural e econômica. Se o mundo à nossa volta se caracteriza como extremamente individualista, excludente e preconceituoso, a Igreja está ciente da necessidade de incluir crianças, jovens, mulheres, homens e idosos nas suas atividades.
Nas nossas comunidades, fazem-se sentir avanços signifi cativos. Em meus 25 anos de Ministério Pastoral, em boa parte vivenciados em Três de Maio/RS, percebo que há a necessidade de se concretizar ainda mais a diversidade na representação de decisões nas instâncias da IECLB. Já houve modestos avanços, mas outros mais são necessários. Nesse sentido, destaco dois fatos recentes.
Por ocasião do último Concilio Ordinário da IECLB, realizado em Chapecó/SC, a Juventude Evangélica conseguiu a aprovação de uma vaga aos Concílios entre as instituições e setores convidados. Ainda: os Sínodos que, por seu número de membros, têm direito a um Delegado leigo a mais, se comprometeram a eleger como Delegado aos próximos Concílios uma pessoa jovem com idade entre 18 e 30 anos.
Por ocasião da celebração pelos 30 anos de reconhecimento público de mulheres no Ministério Ordenado na IECLB, foi discutida novamente a presença de mulheres em cargos de liderança e política de gênero. Foi destacada a observância à recomendação da Federação Luterana Mundial (FLM), que sugere a participação mínima de 40% de mulheres em todas as comissões e representações das suas Igrejas-membro, garantindo, dessa forma, a equidade de gênero nas representações ecumênicas. As participantes reafi rmaram que, em âmbitos comunitários, paroquiais e sinodais, é necessário ampliar, visibilizar e reconhecer a participação das mulheres em espaços estratégicos de poder e tomada de decisões sobre vários assuntos da vida das Comunidades. Necessitamos construções normativas que implementem equidade e orientem para a inclusão. Isso não ocorre naturalmente. É necessária uma caminhada que eduque as pessoas a reconhecerem e a exercitarem a igualdade de condições e de direitos.
Comunidade: testemunha de um acontecimento
A compreensão luterana de Igreja afi rma: há Igreja onde a Palavra de Deus é anunciada e onde os sacramentos são corretamente administrados. Nesta compreensão, prevalece o acontecimento. Igreja é, por essência, acontecimento. A Igreja não está aí para anunciar a si mesma. Ela está aí para anunciar o Reino de Deus e a sua justiça. Não é simplesmente fazer as pessoas escutarem o Evangelho e pedir a elas que sejam um pouco mais humanas, mas é pôr em prática o fato de o que o Reino de Deus está próximo.
A Igreja não está aí para anunciar a si mesma |
Os resultados disso são os desafi os do serviço comprometido com a integridade do ser humano, com a justiça, a viver a solidariedade com os excluídos. Essa é a razão de estarmos desejosos por uma Igreja inclusiva. Por aí passa o testemunho do Evangelho de Jesus Cristo para dentro do mundo, hoje submetido à lógica capitalista da prosperidade, da ambição pessoal, do sucesso e da competência. O testemunho do Evangelho está ligado à mudança de vida das pessoas: o Reino de Deus está próximo, convertam-se e creiam no Evangelho. Não conseguimosperceber nem anunciar, tampouco celebrar a proximidade deste Reino se não aceitarmos mudar as nossas prioridades e a nossa visão de vida. Talvez então ocorra que a gente não mais priorize ‘coar os mosquitos, engolindo os camelos’ da injustiça e da crueldade, visíveis no cotidiano, o que nos lembra a advertência de Jesus de que deveríamos fazer estas coisas (secundárias) sem desprezar aquelas (Mt 23.23).
É importante que Comunidades caminhem nesta direção. O que Deus espera de nós é que caminhemos em direção a uma Igreja de misericórdia e de serviço, como fermento na massa, como sal e luz do mundo.
P. Renato Küntzer, formado em Teologia pela Faculdades EST, em São Leopoldo/RS, exerceu o Ministério Pastoral na Paróquia de Rio Ponte, em Domingos Martins/ES, e na Paróquia de Três de Maio/RS. Atualmente, é Pastor Sinodal do Sínodo Noroeste Riograndense, com sede em Três de Maio