“A opinião de muitos não pode se sobrepor a verdade da “opinião” de Deus sobre a dignidade humana.”
Uma história bíblica, quase uma novela, quarenta e um versículos do capítulo 9 no Evangelho de João, nos traz esta pergunta: de quem é a culpa? O desenrolar da narrativa revela um cego, um milagre, um Senhor! Mas a narrativa também aponta uns discípulos, uns fariseus, algumas perguntas. Na época em que vivemos a opinião de muitos é mais aceita do que de poucos. Ainda bem que nem sempre é assim.
Os discípulos e os fariseus percebem um problema; aqueles a cegueira e estes a cura. De quem é a culpa? Quem o tornou cego? Quem o curou? Quem bagunçou nossa rotina, colocando no centro um problema que não era nosso? O cego e Jesus!
Já Jesus vê um cego de nascença, uma pessoa, não um problema. Jesus vê nele algo que aponta para o Reino de Deus, uma limitação física que será superada, para a manifestação da glória de Deus entre as pessoas. Não, não estou falando da cegueira, embora a cura aponta para o cuidado de Deus por suas criaturas. Estou falando da limitação física imposta ao ser humano de não se sentir responsável pelo outro. Antes de Jesus enxergá-lo, era mais um, um cego não visto. Vivia sim da caridade de algumas pessoas, mas ninguém era responsável por ele. Agora Jesus Cristo o enxerga, cura, ele é visto. De quem é a culpa? De Jesus! Ele o enxergou, agora também todos os outros o enxergaram. E perguntaram-se: o que faremos com ele? Assim, tão de repente, muda-se um conceito, há uma dignidade, um amor de Deus que o enxerga. Que problema, antes estava melhor! Antes podíamos agir com caridade, agora ele está entre nós e quantos outros também virão! Que dor de cabeça, Jesus agora dizer que somos responsáveis uns dos outros e que o cego, que tinha seu lugar, agora está entre nós, não mais cego, mas ainda chamado como tal.
Perdoem a seriedade desta ironia: Que problemão Jesus nos deu abrindo os olhos para o cego (e tantos outros que não são vistos), não somente abrindo os olhos do cego! Mas estes não estão pisando nossas calçadas, nem subindo nossas escadas, nem precisando de intérprete de libras, nem de acolhida, nem espaço adequado em nossos templos, nem da rampa que não existe para subir ao altar e comungar. Não precisamos nada disso, pois não há quem o precise (se abusei da ironia, me perdoem novamente)! Acho que Jesus Cristo precisa curar e abrir muitos olhos de cegos que pensam que vêem (João 9.41). A culpa é de Jesus, que abre olhos, bocas e ouvidos! A opinião de muitos não pode se sobrepor a verdade da “opinião” de Deus sobre a dignidade humana.
P. Murilo Jung
Nova Petrópolis