Alguns incidentes do passado não nos permitem obter um número maior e mais preciso de dados da caminhada da Igreja Evangélica de Confissão Luterana, no município de Garuva. Sabemos, sem entrar em detalhes, que incêndios e desmoronamentos destruíram boa parte da história documentada da Comunidade Martin Luther. Entretanto, alguma coisa permaneceu (escrita e na tradição oral, além de fotografias), nos possibilitando ousar escrever o presente resumo, por ocasião dos 80 anos de sua fundação e dos 55 anos de inauguração do atual templo. Assim, simbolicamente, escolhemos este dia 04 de maio de 2003 para comemorarmos ambas as ocasiões, com culto paroquial e almoço festivo.
No início da década de 20, nos anos de 1922 e 1923, chegaram os primeiros evangélico-luteranos à Vila São João do Palmital, hoje Garuva, então pertencente ao município de São Francisco do Sul. Após duas tentativas anteriores de colonização da região, não muito bem sucedidas (1841 e 1857), a fundação oficial da localidade deu-se em 1918. Percebemos que quatro anos depois o povo luterano já marcava presença no lugar, que alcançaria sua emancipação político-administrativa em 20 de dezembro de 1963.
A Comunidade foi fundada por dez membros e suas respectivas famílias: Alberto Beilke, Franz Gütz, Friedrich Storch, Fritz Kreutzfeld, Gustavo Larsen, Henrique Tiegs, Hermann Küster, João Haerchen, Ludwig Mallon e Luiz Drefahl. Estas pessoas eram basicamente oriundas da região de Jaraguá do Sul, vindo para cá em busca de melhores condições de sustento para seus familiares e contribuindo para o desenvolvimento inicial da localidade. No decorrer dos anos, ainda, viria gente do Alto e Médio Vale do Itajaí, de Joinville e, mais recentemente, da Grande Curitiba e do sudoeste paranaense.
Sem podermos precisar a data, o primeiro culto ocorreu em 1923, celebrado pelo P. Moritz Hess, de Pirabeiraba. Henrique Tiegs, o primeiro presidente da jovem Comunidade, junto com os outros fundadores, adquiriu naquele ano uma casa coberta de palha, onde é hoje o Cemitério Luterano. Esta se tornou o primeiro templo. Conta-se que o P. Hess foi um grande colaborador e incentivador nesta jornada.
Em 1927, a Comunidade tinha 20 famílias, o dobro do início. Assim, foram necessárias a reforma e a ampliação do templo. Apesar disso, os membros foram motivados a se filiarem a Rio Bonito. Entre as razões colocadas, estavam a distância a ser percorrida a cavalo pelo pastor, o número de lugares que ele atendia (aproximadamente, a atual área das Paróquias de Pirabeiraba, Rio Bonito e Vila Nova), os poucos adolescentes do ensino confirmatório e o baixo número de membros, se comparado às demais Comunidades. Possivelmente, houve uma diminuição do número de cultos em Garuva.
Doze anos mais tarde, em 1939, no 9o ano do pastorado de Wilhelm Dommel, houve uma nova ampliação do templo. Numa destas duas reformas, o mesmo recebeu telhas para a sua cobertura. Conclui-se, então, que o número de famílias aumentou bem e que os trabalhos voltaram normalmente a ser realizados em Garuva.
Durante a 2a Guerra Mundial, especialmente entre 1942 e 1945, houve perseguição aos alemães e descendentes no Brasil, incluindo o povo luterano. Como curiosidade, cita-se a prisão do P. Dommel, além de outras dificuldades que devem também ter abalado os membros da Comunidade Martin Luther.
A década de 40 foi muito marcante na vida dos luteranos de Garuva. Por volta de 1942, desmanchou-se o templo para a construção de outro, sendo a madeira vendida. O novo seria erguido no terreno atual. Foram seis anos de provações à fé das pessoas. Durante este período, ocorreram três grandes vendavais que derrubaram a construção. Não há registro do primeiro, mas se deduz que ocorreu entre 1942 e 1943, quando as paredes de madeira já estavam levantadas. Assim, decidiu-se fazer a obra com tijolos. A segunda vez foi mais trágica ainda. Em 1944, foi lançada a pedra fundamental e, com muitos esforços, logo a obra foi inaugurada com a celebração de um culto, no dia 03 de agosto. Todavia, não muito tempo depois, um forte vendaval derrubou o templo. Mais uma vez, a Comunidade “arregaçou as mangas” e, com fé e persistência, arrecadou os recursos necessários para conseguir seu objetivo. No entanto, uma terceira grande ventania pôs tudo abaixo, novamente, em 1946. Grande parte dos documentos foi perdida no desmoronamento. A quarta tentativa, pela graça do Senhor, deu certo. Em 1947, iniciou-se a construção e no ano seguinte (em 1o de fevereiro), finalmente, nossa igreja estava pronta para a adoração e a pregação da Palavra de Deus. Nestes anos difíceis, a Comunidade se reuniu nas casas dos membros para celebrar seus cultos.
Como curiosidades, citamos ainda que, nesta década, em 24 de fevereiro de 1946, a Assembléia Geral da Comunidade Dona Francisca, que congregava aproximadamente a área atual das três Paróquias já citadas, decidiu que a contribuição de cada família ou membro seria de 30 cruzeiros anuais. Havia também uma taxa avulsa para cada atendimento prestado: batismo, confirmação, casamento, enterro com badalar de sino (Garuva não tinha!), enterro sem o badalar e visita pastoral na casa. E ainda, em 1948, foi adquirido um Ford usado, o primeiro automóvel para o serviço do pastor. Antes, ele já utilizava uma motocicleta. No entanto, durante mais de vinte anos, os pastores vinham a cavalo e de charrete para cá.
A partir de abril de 1952, tem início o ministério do P. Werner Schwenk. Todavia, ele permaneceu menos de 4 anos, pois pediu demissão por motivos particulares. Curiosamente, acabou ocorrendo uma troca. Seu substituto, P. Georg Burger, vindo do Estado do Espírito Santo, começa a trabalhar em fevereiro de 1956. O P. Schwenk assume o ministério na Paróquia onde o P. Burger atuava. Isto é, um terminou sendo o antecessor e o sucessor do outro, e vice-versa.
Por volta de 1954, teve início a atuação de missionários, em Garuva, da hoje Missão Evangélica União Cristã - MEUC. O primeiro deles, que residia em Blumenau, tinha o sobrenome de Stenbock. De lá, ele vinha num carro bem antigo, cujas rodas pareciam como de bicicleta. A partir do início dos anos 60, com João Brückheimer, os missionários vinham de Joinville. A MEUC, desde aquela época, tem sido um dos instrumentos de Deus na evangelização de vidas e na edificação espiritual da Comunidade Martin Luther.
Temos dois registros do número de membros deste período. Um deles aponta 60 famílias em 1955. O outro, 55 famílias em 1962. Pode ser apenas uma questão de ausência de dados mais precisos. Ou, talvez, houve a migração de um grupo para novas áreas de colonização, especialmente, o Estado do Paraná. Há registro de que um dos fundadores da Comunidade fez assim. Também, há pioneiros destes lugares nascidos em Garuva, à época distrito de São Francisco do Sul. Quem sabe, outros se mudaram para centros urbanos maiores, como a Grande Curitiba, movimento presente ainda hoje.
Os anos 60 também foram muito marcantes. Nesta década, surgiram três importantes trabalhos. O culto infantil, em língua portuguesa, teve início em 1968, cujos 35 anos serão comemorados no próximo dia 14 de junho. Em alemão, havia já dois grupos no início da década. Um era coordenado pelo senhor Otto Röder e outro, pela senhora Erika Krutzsch. A Ordem Auxiliadora de Senhoras Evangélicas – OASE surgiu em 30/06//1968. Na verdade, este foi o segundo grupo de mulheres em Garuva, pois, desde 09/10/1956, a MEUC já possuía um. Alguns anos após, o trabalho foi unificado. Também a juventude começou a se reunir por este tempo, sem no entanto podermos precisar a data.
Nesta época, percebemos a transição da língua alemã para o português nas atividades da Igreja. Por exemplo, enquanto a OASE era em alemão, já no ano de 1968, em São João Abaixo, iniciou outro grupo em língua portuguesa. E com o culto infantil, mencionado acima, também foi semelhante.Tal transição deve ter começado por ocasião da 2a Guerra Mundial, pois a língua germânica foi proibida no País à época. Aos poucos, houve mais mudanças e, atualmente, não há mais programações em alemão na Comunidade, a não ser uma palestra mensal na MEUC. Boa parte dos descendentes nem domina mais o idioma dos antepassados. Percebemos também o ingresso de várias pessoas de outras origens étnicas, via casamento ou profissão de fé.
Com relação ao templo da Comunidade, este ganhou um sino e um harmônio. Quanto ao primeiro, iniciou-se uma campanha de doações em agosto de 1960. Meses depois, houve a inauguração do mesmo. O harmônio foi fruto de doações em 1964. E ainda, entre 1967 e 1968, o prédio sofreu reforma e ampliação.
Na década de 60 ainda, em 1965, se junta ao P. Burger, no trabalho paroquial, o P. Friedrich Genthner. O primeiro passou a se dedicar exclusivamente à Instituição Bethesda, com asilo e hospital, em Pirabeiraba. Aliás, os dois trabalhos foram separados, embora as Comunidades continuassem como suporte à mesma. No decorrer dos anos, inclusive, Garuva ajudou em várias ocasiões aquela instituição nos seus momentos difíceis.
O surgimento da juventude, do culto infantil e da OASE, demonstram um período de avivamento pelo qual passava a Igreja. Citamos ainda outras mudanças, no âmbito paroquial. Em 1967, houve o advento da contribuição voluntária com limite mínimo para os membros. Isto é, não mais se daria dinheiro em separado para cada atendimento prestado. E foi instituído o exame oral e escrito para os confirmandos, que também estavam desautorizados a participarem de danças, de qualquer tipo e em qualquer lugar. Neste ano, a título de informação, fundou-se a Comunidade de Guaratuba, em 1o de dezembro.
Na década de 70, os grupos de estudo bíblico têm forte impulso em toda a Paróquia, conforme relatório de 1976 do P. Genthner. Foi neste período, ainda, que surgiram mais grupos de culto infantil na Comunidade Martin Luther. Também, por estes anos, os casamentos passaram a ser celebrados nos locais de origem do casal. Até esta época, então, com poucas exceções, os noivos de Garuva tinham de se deslocar a Pirabeiraba, sede paroquial.
Em 19 de maio de 1978, numa Assembléia do Distrito Joinville, foi aprovada a divisão da área da Comunidade Dona Francisca em duas: Pirabeiraba e Rio Bonito. Já em março do ano seguinte, Jörg Michel tornou-se o primeiro pastor residente na Paróquia de Rio Bonito. Ele e sua família residiram em Garuva, durante quase dois anos, numa moradia alugada em São João Abaixo, em frente à residência da família Benkendorf. No entanto, a casa pastoral foi construída em Rio Bonito, sendo inaugurada em 1980. Assim, o P. Michels e sua família se mudaram para lá. Não muito tempo depois, o templo da Comunidade Martin Luther sofreu nova reforma e ampliação.
Em 1986, a divisão se constituiu oficialmente nas duas paróquias atuais, sendo que Vila Nova já havia se tornado independente. Ambas, desde aquele período, trabalham conjuntamente como União Paroquial Dona Francisca, com uma secretaria em comum. Em julho do mesmo ano, Rio Bonito já contava com um novo pastor, Horst Lümke.
Na década de 80, ainda, houve a descentralização do trabalho com a OASE. Além do Centro e de São João Abaixo, foram surgindo os demais grupos que hoje temos na Comunidade. Mais de 100 mulheres participam dos mesmos, indo ao encontro das necessidades espirituais, emocionais e materiais das pessoas ao seu redor.
Os anos 90 começam com um novo obreiro na Paróquia de Rio Bonito, o P. Sigfrid Baade. Nesta década, construiu-se, em algumas etapas, o atual pavilhão de nossa Comunidade, que tem servido para diversas atividades de caráter espiritual, incluindo cultos especiais, bem como para encontros de confraternização e reuniões.
Ainda, em 1998, têm início os cultos em Garuva Acima, na propriedade da família Teske. Tempos antes, porém, já havia estudo bíblico, OASE e trabalho com crianças no local. No ano seguinte, ainda, o ponto de pregação de Itapoá, criado em 1981, inaugura seu templo, em 22 de setembro. Do seu início até aquela data, os cultos eram celebrados nas casas.
É durante o ministério do P. Sigfrid que toma impulso maior o sonho de se ter um obreiro residente em Garuva. Desde a década de 80, os primeiros “ventos” já começaram a soprar a favor deste ideal, quando da presença do P. Michels aqui. Assim, foi encaminhado um pedido, destinado à direção da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil – IECLB, para se ter um bacharel em Teologia que aqui fizesse sua residência, conhecida como Período Prático de Habilitação ao Pastorado (PPHP). As Comunidades de Garuva, Guaratuba e Itapoá contariam com alguém mais próximo de si, então.
Interessante que, pela mesma época, a MEUC também trabalhava para ter um missionário residente na cidade. Desde abril de 1997, Reni Schmidt, vinha de Joinville, atuando mais especialmente aqui e em Rio da Prata. No início de 1998, foi terminada a construção da casa da Missão, onde são realizadas várias atividades atualmente. Também foi providenciada uma moradia para o missionário Reni, que nela reside desde junho de 2001.
Em agosto de 1999, Adriane Beatriz Dalferth Sossmeier, esposa do P. Jandir Ilton Sossmeier, inicia seu PPHP na Paróquia de Rio Bonito. Conta-se que, na falta de uma listagem de membros, com seus respectivos endereços, ela saía de casa em casa, em Garuva, perguntando se morava algum luterano ali. E, ainda, no “meio do caminho”, em fins daquele ano, o P. Siegfried se transfere para Blumenau, deixando-a temporariamente sem um mentor que a orientasse. Logo, porém, chegaria o P. Nelson Sommer para assumir a vaga. Hoje, a Pa Adriane, que terminou sua residência em meados de 2000, atua junto ao marido, em Joinville. Em seguida, em agosto do mesmo ano, dando continuidade ao projeto, chega Éderson Neves Garcia com sua família. Pela atuação da sua antecessora e a dele, que se estendeu até julho de 2001, concluiu-se que era chegada a hora de abrir o 2o pastorado na Paróquia. Éderson atualmente reside em São Gabriel do Oeste/MT.
Destacamos que o P. Nelson, apoiou muito a criação deste novo pastorado. Foi com ele, ainda, que surgiu o calendário anual de atividades, cuja confecção é financiada pelo patrocínio de membros das Comunidades. Os cultos de Sexta-Feira Santa passaram a contar com a participação de um grupo de teatro de Garuva, encenando a paixão e a ressurreição de Cristo (idéia iniciada com Adriane). Os estudos bíblicos e o treinamento de líderes ganharam novo fôlego.
Em agosto de 2001, após 78 anos de caminhada, sem contar os dois primeiros anos do P. Michels, a Comunidade Martin Luther de Garuva tem o seu primeiro pastor residente, Leonésio Oechsler. Ele, inicialmente, morou em São João Abaixo, numa casa alugada. Com pouquíssimos recursos, mas com fé, ânimo e mobilização, construiu-se a casa pastoral, num terreno vizinho às dependências da Comunidade. O P. Leonésio foi residir na mesma em abril de 2002. Ele, no entanto, ficou pouco tempo em Garuva. Já em fins de julho do mesmo ano, Alexandre Fernandes Francisco veio com a família para assumir o pastorado em seu lugar, sendo instalado em culto, pelo P. Sin. Manfredo Siegle, no dia 1o de agosto. O P. Nelson cuida das Comunidades de Rio Bonito e Estrada D’Oeste, além do ponto de pregação de Estrada Pirabeiraba.
Como acontecimentos mais recentes, entre outros, citamos a criação de mais um grupo de estudo bíblico, a construção do muro da casa pastoral e a colocação dos portões da mesma. Também, há poucos dias, iniciou-se a troca da tela que cerca o terreno da Igreja. E, desde 1o de abril, Garuva, Guaratuba e Itapoá podem contar com uma sucursal da secretaria da União Paroquial, instalada no pavilhão comunitário, funcionando às terças e sextas.
Hoje, junto com a MEUC, temos os seguintes trabalhos na Comunidade de Garuva: cultos, hora mensal, grupos de oração, culto infantil, ensino confirmatório, adolescentes, jovens, jovens adultos, OASE, grupo de casais, estudos bíblicos, visitadores, grupos de louvor, palestra batismal, grupo de teatro, grupo de fantoches, entre outros, além de iniciativas na área social. Contamos com aproximadamente 300 famílias e membros individuais. Há, todavia, mais luteranos no município de Garuva: os que estão inscritos em Rio Bonito (algumas famílias da localidade de Três Barras). Também temos a presença da IELB – Igreja Evangélica Luterana do Brasil.
A história da Comunidade Martin Luther continua. Há desafios à frente e alvos a serem alcançados na missão para a qual Deus nos chama. O mais importante, contudo, é saber que somos amparados e orientados pelo Espírito Santo. “Até aqui nos ajudou o Senhor”, diz I Samuel 7.12. Pela sua graça, permanecerá nos ajudando, a fim de que testemunhemos do evangelho de Jesus Cristo ao nosso redor. Que assim seja!
P. Alexandre Fernandes Francisco (04/05/2003)
- Fontes:
1) Relato escrito de Bernardo Ruffmann, datado de 04/03/1966.
2) Livro Ouro da Comunidade Martin Luther.
3) Revista dos 150 anos da Comunidade Evangélica de Joinville, dez. 2001.
4) Lutherische Kirche in Brasilien: 1898/1905-1955.
5) História da Comunidade Evangélica Luterana de Pirabeiraba – “Testemunho da fidelidade de Deus”; Claus Brunken (coordenador), jun. 2002.
6) Informações de membros da Comunidade Evangélica Martin Luther de Garuva.
P. Alexandre Fernandes Francisco