A observância do mandamento do amor
O sentido da existência humana pode ser entendido a partir de três indicativos presentes em Mateus 22.37,39: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento... Amarás o teu próximo como a ti mesmo”.
a) O primeiro indicativo é o amor a Deus a partir da entrega total. Entregando-se a Deus, a pessoa não idealiza a si mesma, ao próximo e aos bens materiais;
b) O segundo é o amor ao próximo. Esse indicativo exige a construção de relações baseadas no reconhecimento de que somos semelhantes e nos reconhecemos pertencentes à mesma espécie, dependentes do cuidado de uns para com os outros;
c) O terceiro indicativo é o amor a si mesmo. Reconhecer-se como um ser capaz de amar está diretamente relacionado ao reconhecimento como um ser de amor e um ser amado por Deus. Amar e aceitar o outro implica em amar e aceitar a si mesmo.
A prática do amor, nesses três sentidos, desperta o sentimento de compaixão e solidariedade. Ter com-paixão, compadecer-se, é ser capaz de sentir o sofrimento do outro de forma profunda em seu próprio corpo. Ser misericordioso é ter um coração voltado para a miséria do outro. É sentir-se afetado por causa da situação deplorável e triste na qual o outro está imerso.
Por causa do sentimento de compaixão e misericórdia, as pessoas sentem-se motivadas a agir em favor do outro, instituindo a prática do respeito e da fraternidade.
O amor de Deus exige responsabilidade para com a vida do outro e o conjunto de Sua criação. A educação é uma das formas de responsabilizar-se pela Criação e pelo desenvolvimento integral da pessoa.
A prática da esperança e da reconciliação
“Regozijai-vos na esperança, sede pacientes na tribulação, na oração, perseverantes; compartilhai as necessidades dos santos; praticai a hospitalidade; abençoai os que vos perseguem, abençoai e não amaldiçoeis.” (Romanos 12.12-14).
A esperança motiva e inspira a vivência de um projeto de vida digna e justa. Os laços que uniram a escola e a igreja na história são caracterizados por um projeto de esperança: esperança por justiça e paz, liberdade e fraternidade.
O projeto de esperança se realiza através da defesa da dignidade humana e do serviço concretizado através de ações com vistas a uma vida digna. A tarefa de cuidar desse projeto é atribuição da família, da escola, da igreja e dos seus diferentes grupos, da sociedade.
A prática e a construção de um projeto de esperança são inspiradas pela ação de Deus entre nós e experimentadas através de testemunhos de fé e de ações de justiça. Praticar atos de justiça e de misericórdia, proclamar a esperança e vivenciar a reconciliação entre as pessoas é tarefa anunciada por Deus:“Ele te declarou, ó homem, o que é bom e que é o que o Senhor pede de ti: que pratiques a justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus.” (Miquéias 6.8).
A misericórdia de Deus e a reconciliação com Ele nos liberta da preocupação com o futuro e nos faz perceber a importância da ação concreta na defesa e promoção da vida, através da educação, da saúde, do trabalho. A esperança torna possível a vivência de um projeto de paz e justiça que se faz através da reconciliação.
A reconciliação provém de Deus, que a tornou possível através da morte e ressurreição de Jesus (2 Coríntios 5.18). Através de Cristo, fomos reconciliados com Deus. Por isso, somos embaixadores e embaixadoras de Jesus que fala e age por meio das pessoas. Deus nos incumbe de uma missão que abrange o âmbito público e particular: ser emissários do seu amor para com seus filhos e suas filhas.
A tarefa de educar para a liberdade
“Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, (...) ensinando-os a guardar todas as cousas que vos tenho ordenado.” (Mateus 28. 19-20).
A tarefa de educar é mandamento que provém de Deus. A ordem de fazer discípulos e de evangelizar implica um processo educativo. A Igreja, ao ocupar-se com a educação, cumpre a ordem de Deus e, como decorrência, responsabiliza-se pela preservação da Criação de Deus.
A partir da perspectiva evangélico-luterana, o processo educativo envolve as pessoas e assume caráter participativo e democrático. Toda a comunidade participa no processo. Ele não se dá de cima para baixo, mas se constrói a partir da base, com o envolvimento de todos os setores implicados na tarefa educacional. A tarefa de educar está presente e acontece em todos os momentos da vida cotidiana: “Estas palavras que, hoje, te ordeno estarão no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te. (...) Quando teu filho, no futuro, te perguntar, dizendo: Que significam os testemunhos, e estatutos, e juízos que o Senhor, nosso Deus, vos ordenou? Então, dirás a teu filho: Éramos servos de Faraó, no Egito; porém o Senhor de lá nos tirou com poderosa mão (...).” (Deuteronômio 6. 15-25).
Através da educação, mantemos viva a memória, reativando a história dos antepassados. A memória cumpre a função da religação e da atualização dos valores e princípios orientados pela fé em Deus.
O processo educativo acontece de modo relacional, pois pessoas de diferentes idades e contextos interagem, trocam informações sobre a vida e, conjuntamente, aprendem formas de viver em grupo. A educação faz parte da vida como um todo e abrange as pessoas em todas as suas dimensões. O processo educacional acontece em diferentes espaços: no ambiente familiar, na comunidade (em seus diversos grupos e setores), na escola pública e comunitária, na empresa. Através da sua ação educativa, a Igreja contribui para a formação integral do ser humano e a construção da consciência criativa e crítica.
A pessoa ocupa posição central no processo educativo, sabe que é alvo do amor de Deus e percebe a gratuidade da vida. Em decorrência, sente-se livre para colocar a sua existência a serviço da promoção da vida e da preservação da criação de Deus.
O diálogo e o respeito como expressão da unidade
“Pois, em um só Espírito, todos nós fomos batizados em um corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos, quer livres. E a todos nós foi dado beber de um só Espírito.” (1 Coríntios 12.13).
A educação somente é completa quando acontece em comunidade. Através da comunhão entre as pessoas, Deus realiza a sua missão.
A comunidade é múltipla, ou seja, é formada de diferentes membros, que recebem o encargo de cuidar uns dos outros a fim de preservar a unidade na diversidade, lembrando a advertência do apóstolo Paulo: “(...) Deus coordenou o corpo, concedendo muito mais honra àquilo que menos tinha, para que não haja divisão no corpo; pelo contrário, cooperem os membros, com igual cuidado, em favor uns dos outros.” (1 Coríntios 12.24-25).
Cooperar com cuidado significa agir com respeito, valorizando cada pessoa no seu modo de ser, buscando ações educativas que possam auxiliar as pessoas a viver dignamente e a ser felizes. Também significa apostar no diálogo como forma de aproximação e resolução de conflitos.
O diálogo e o respeito são meios através dos quais podemos manter e expressar a unidade eclesiástica. Essa unidade é formada pelo conjunto de pessoas que têm suas características individuais e, não obstante, formam comunidade a partir de sua dependência de Deus e de seu cuidado mútuo.
O servir como testemunho de fé e amorosidade
A fé é dom de Deus e se manifesta no serviço. Deus realiza o seu serviço no mundo através das pessoas, que são chamadas e capacitadas para serem sacerdotes e sacerdotisas que anunciam e vivem o amor de Deus.
A educação também é serviço de Deus entre nós e está voltada para todas as pessoas, sem nenhum tipo de discriminação.
As pessoas são chamadas por Deus, através do Espírito Santo, para servir na comunidade educativa. Elas são valorizadas em sua individualidade. Por causa da riqueza que está presente no modo de ser de cada um, diversos tipos de serviço são realizados, o que enriquece e torna possível a edificação de comunidade, pois “os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo. E também há diversidade nos serviços, mas o Senhor é o mesmo”. (1 Coríntios 12.4-5).
Através do serviço ao outro, anunciamos o Evangelho em palavra e ação, mantendo a necessária coerência entre o coração e a boca. Essa postura é fruto de uma educação que deixa transparecer a esperança, a fé e o amor que movem o ser e o fazer da pessoa.
Para cumprir a vontade de Deus, por intermédio de Jesus, recebemos a promessa de que ele está ao nosso lado: “E eis que estou convosco todos os dias até a consumação do século” (Mateus 28.20). Deus também nos auxilia e capacita para a tarefa de educar, através da ação do Espírito Santo: “Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas (...) até aos confins da terra.” (Atos 1.8).
A tarefa de educar na fé em Deus extrapola limites e fronteiras estabelecidas pelas leis humanas. Ela também é testemunho da boa nova da salvação, pois sua finalidade consiste na preservação da criação de Deus e na construção de relações de paz, justiça e solidariedade.
Fonte: Diretrizes de uma Política Educacional da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil