No caminho de Emaús - Lucas 24.13-35

Subsídio bíblico para a mensagem

08/05/2011

Considerações sobre o texto

Três dias depois da morte de Jesus, duas pessoas caminham por uma estrada. Partiram de Jerusalém e estão a caminho de Emaús. Uma dessas pessoas é Cléopas (v.18); a outra não se sabe. Pode ser um casal. O evangelho de João 19.25 nos dá uma pista: aos pés de Jesus na cruz estava sua mãe, a irmã dela, Maria Madalena e Maria, mulher de Cléopas. Talvez neste caminho andem Cléopas e sua esposa Maria. O nome dela não é citado no relato. Ela não fala. Ela não opina. Ela não reparte sua dor. Não parece ter uma posição de igualdade com Cléopas.

Estas pessoas, Cléopas e Maria, caminham sem esperança. Corpos curvados, cansados, desamparados. A dor dos acontecimentos em Jerusalém pesa nos seus ombros. As mulheres que tinham ido ao túmulo pela manhã do terceiro dia contaram que ele estava vivo, mas isto deveria ser só conversa de mulher, boato tolo. Afinal, tinham visto Jesus morto. O sonho tinha acabado.

De repente, no meio do caminho, um homem se junta ao casal. Tristeza, medo, saudade, incerteza, falta de esperança impede-lhes que reconheçam o amigo amado. A completa falta de esperança no futuro as impede de enxergar, de perceber.

Jesus reconhece a dor dessas pessoas e caminha com elas. Ele não julga nem condena. Ele pergunta. Quer saber o que estão sentindo. Ouve quando abrem o seu coração e as ajuda a relembrar tudo o que tinha ensinado. Jesus quer ouvir como experimentaram o que aconteceu e entender por que há tanta dificuldade em acreditar no inimaginável, naquilo que as mulheres anunciaram.

Os ouvidos e mente até pensam no que foi dito, mas o coração não consegue acreditar. Somente o relembrar não permitiu que o conhecessem. Foi no partir do pão que os olhos dessas pessoas foram abertos.

“O aproximar-se, o caminhar junto um pedaço de caminho, a escuta atenta, antes e depois de perguntar, a própria pergunta, que busca conhecer o saber alheio, tudo isso vai estabelecendo um clima de confiança, um colocar-se em pé de igualdade, um falar com, que já não é mais apenas um falar a alguém. Nada começa com ensinar. Tudo começa com aprender. Jesus não vem ao encontro daquele casal de discípulos para explicar nada. Vem para conhecer em que pé se encontram. Vem para saber porque seus olhos estão impedidos de ver. Vem buscá-los ali onde estão. Para, só depois,
partir, com eles, de onde eles estão, em direção a um momento novo.” (Carlos A. Dreher. O caminho de Emaús. Leitura bíblica e educação popular.
Serie “A Palavra na vida”, n 71/72, 1993, p.15)

Jesus também não fica só no ouvir e perguntar. Chega um momento em que é preciso clarear as coisas. Relembrar a experiência de como Deus age no mundo não pode ficar para depois. Compreensões errôneas precisam ser clareadas. Interpretações precisam ser desafiadas. Jesus não faz uma chuva de versículos bíblicos, mas relembra a história de Deus com o seu povo no passar dos anos, de Moisés aos profetas.

Mas há algo mais, quando Cléopas e Maria reconhecem Jesus, após o partir do pão, ele não permanece. Ele vai embora, desaparece. Sua missão está cumprida. Agora quem precisa continuar na missão de anunciar o ressuscitado são seus seguidores e seguidoras.

Diaconia

Caminhar com pessoas na tribulação de suas vidas é uma das muitas tarefas diaconais que a comunidade de Jesus Cristo afirma e assume. Essa tarefa é árdua e exige uma enorme paciência revolucionária. Muitas vezes temos pressa. Há muita gente esperando por acompanhamento. Há gente esperando por alguém que caminhe junto. Por outro lado, temos uma dificuldade enorme de “entrar na casa ou ficar com a pessoa.”

Caminhar com alguém significa caminhar no passo da outra pessoa, no seu ritmo. É permitir que descanse quando se sente cansada. É ajudar a carregar a carga por um determinado trecho. Mas principalmente, caminhar com alguém é reconhecer que a caminhada pertence à outra pessoa. Somos testemunhas do seu processo, do seu esforço e da sua dor. A outra pessoa precisa ter a certeza de que confiamos nela e de que mesmo quando ela sentir-se totalmente sem esperança, nós continuamos confiando que Deus a está carregando no seu colo e acalentando com muito amor.

Mas o acompanhar também tem limites. Isso fica bem claro quando Jesus assume uma postura de ajudar aquelas pessoas no caminho a enxergarem e reconhecerem o que aconteceu. Há momentos em que pessoas precisam ser confrontadas com as consequências de seus atos. Há momentos em que outras pessoas precisam tomar decisões por quem já não tem mais esperança, como no caso de pessoas com tendências ao suicídio, ou que anunciam o desejo de tirar a vida de um cônjuge ou alguém que lhe feriu muito. Este não é o caso do relato bíblico, mas são situações que encontramos em nosso tempo e serviço diaconal.

Também é preciso ter claro que, assim como no texto, pode acontecer que apesar de toda nossa boa vontade, nossa companhia, nosso comprometimento, há pessoas que querem seguir seu próprio caminho, pessoas que não estão abertas para experimentar algo novo, que não querem comprometer-se com aquilo que abrir os olhos significa. Estas também nós entregamos a Deus.

Há algo mais que chama atenção no texto: a sabedoria de confiar na capacidade da pessoa em continuar caminhando sozinha. A exemplo do “desaparecer” de Cristo, chega uma hora que também precisamos seguir outros caminhos. Isto é difícil, pois gostamos quando alguém depende de nós. Isso nos torna importantes. Este sentimento, mesmo que bastante humano e normal, precisa ser constantemente identificado e combatido no trabalho diaconal.

Dia das Mães

O que é ser mãe se não um caminhar ao lado de pessoas que nascem, se descobrem gente e aos poucos vão escapando da nossa mão? Ser mãe é assumir a tarefa de permitir que uma nova pessoa viva, cresça, descubra suas habilidades, suas fraquezas. Ser mãe é acompanhar e também saber “desaparecer” para que os filhos e filhas aprendam a viver e assumir responsabilidades.

Ser mãe não é ser a “Rainha do Lar”, nem a heroína que tudo suporta, tudo resolve, tudo doa. Mãe não é aquela dos comerciais de TV, sempre sorrindo, sempre linda e arrumada. Mãe é gente. Gente que cansa, que sofre, que perde a paciência. Gente que precisa de alguém que assuma com ela, de igual para igual, as tarefas da casa e os cuidados com as crianças.

No dia dedicado às mães é importante não cair no sentimentalismo barato e que diminui a mãe como mulher e pessoa. Ser mãe é, com certeza, algo maravilhoso na vida das mulheres que escolheram ser mães e quiseram ser mães. Mas ser mãe não é tudo. A maioria das mulheres continua tendo sonhos que vão além do trocar fraldas e cozinhar. A maioria das mulheres deseja ter um grupo de companheiras com as quais possa conversar, trocar ideias e trocar experiências.

É preciso lembrar também que nem todas as mulheres conseguem ser mães, querem ser mães ou tem a possibilidade de ser mães. Mas isso não as diminui como pessoas nem como testemunhas de Cristo. Lembrá-las nesse dia também é tarefa diaconal. Entrelaçando datas, temas e histórias de vida O que diaconia tem a ver com o dia das mães? Tem tudo a ver. Ser mãe é um trabalho diaconal. Acompanhar nossos filhos e filhas no seu processo de conhecimento e reconhecimento do mundo não é tarefa fácil. Nosso impulso é sempre dizer o que tem que ser feito, como devem agir e também como e em que acreditar.

É difícil caminhar ao lado. É difícil ouvir as dores e queixas sem julgar ou repreender. Afinal, somos pessoas mais vividas e não queremos que sofram. No texto que estamos estudando Jesus nos ensina algo chave: Jesus não tirou as pessoas de sua dor, não fez promessas nem pediu que pensassem no lado bom da coisa. Jesus também não empurrou a responsabilidade para Deus como tanto ouvimos em casos de tragédias: foi Deus que quis assim. Jesus ouviu, relembrou as escrituras, mas não repreendeu as pessoas por seus sentimentos. Por outro lado, Jesus não fugiu de sua responsabilidade. Jesus recontou a história de Deus com seu povo, e quando nada mais lhe restava, partiu o pão, na esperança de que ali o reconhecessem.

Para nós mães, isso também é um lembrete e ensinamento. Não basta somente apontar todos os erros ou relembrar sempre de novo atitudes irresponsáveis. Mais do que isso, importa repartir momentos importantes: refeições conjuntas, cheiro de pão fresco na casa. Para nós, da geração cujas mães trabalhavam somente em casa, há alguns cheiros que nos remetem de volta à infância, à cozinha da mãe: pão de milho, massa caseira, bolacha de mel, café fresquinho. Esses cheiros e comidas não precisam de legendas, nem lembretes, falam por si só e nos remetem a lembranças boas.

Hoje, com mães e pais assumindo duplas e triplas jornadas de trabalho, as possibilidades de preparar uma refeição em família são mais raras, mas não
impossíveis. Neste dia também há um chamado a todas e todos nós: ainda temos escolhas. Podemos caminhar sozinhas e sozinhos ou permitir que outras pessoas caminhem conosco. Podemos convidar pessoas a partilhar nossa vida, com suas dores e alegrias, ou podemos fechar a porta. Podemos repartir o pão, ouvir as histórias dos nossos filhos e filhas, dos nossos irmãos e irmãs, nossas mães e pais, vizinhos e vizinhas, companheiras e companheiros, ou podemos comer nosso pão na solidão. Podemos experimentar a presença de Cristo no meio de nós ou empurrá-lo para longe. Nós temos escolhas. Nem sempre são fáceis. Mas não são
impossíveis.

Pastora Ms. Marcia Blasi
São Leopoldo-RS

Bibliografia

DREHER, Carlos A. A caminho de Emaús: Leitura Bíblica e Educação Popular.
Belo Horizonte: CEBI, 1993, (A Palavra na Vida 71-72).
WEIMER, Tânia Cristina. Auxílio Homilético Lucas 24.13-41. Proclamar Libertação 32, São Leopoldo: EST/Sinodal, 2007, p. 137-143.


Autor(a): Marcia Blasi
Âmbito: IECLB
Testamento: Novo / Livro: Lucas / Capitulo: 24 / Versículo Inicial: 13 / Versículo Final: 35
Natureza do Texto: Pregação/meditação
ID: 13791
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