A liturgia reconciliadora da Santa Ceia

01/07/2008

Na Santa Ceia, come-se pão e bebe-se vinho, mas também come-se e bebe-se a Palavra de Deus. Em outras palavras, Deus vem ao nosso encontro nesta santa refeição. É a grande ‘festa da reconciliação’, pois somos presenteados com uma nova comunhão com Deus e os irmãos. Com o passar do tempo, foram introduzidas inovações na tradicional liturgia da Santa Ceia, deixando muitas pessoas em dúvida sobre como é realmente correto proceder. Algumas dessas questões dizem respeito, principalmente, ao uso do cálice individual ou coletivo, à ingestão de vinho tinto ou suco de uva, ao consumo do pão ou da hóstia e à participação de adultos e crianças. Para ponderar sobre essas temáticas relacionadas a um momento especialmente significativo da vida cristã, a celebração da Santa Ceia,convidamos o P. Carlos Romeu Dege, Mestre em Teologia, integrante do Coli (Conselho de Liturgia da IECLB) e Pastor na Paróquia em Igrejinha/RS. Também faz parte o P. Helio Adolfo Doss, Bacharel em Teologia pela EST, no exercício do Ministério Pastoral há mais de 30 anos, Pastor na Paróquia de Concórdia/SC. Participa, ainda, o P. Eloir Carlos Ponaht, formado pela Faculdades EST e atuando na Paróquia São João de Laranja da Terra/ES, onde fez uma série de estudos bíblicos sobre a Ceia do Senhor. Concluímos esta reflexão com a Pa. Tânia Cristina Weimer, formada em Teologia pela EST, Mestre em Teologia Prática, com área de concentração em liturgia, trabalhando na Paróquia de Nova Hartz/RS e na Coordenação Sinodal de Liturgia do Sínodo Nordeste Gaúcho.



Cálice individual ou coletivo?
Pastor Carlos Romeu Dege

   Para decidir pela forma de distribuição da Ceia do Senhor, é necessário ter clareza do que ela significa. O Reformador Martim Lutero esclarece que a Ceia do Senhor significa ou opera comunhão de todos os santos. Celebrar a Ceia não é outra coisa que receber um sinal certo dessa comunhão e incorporação em Cristo. A Santa Ceia surge do encontro das pessoas com Jesus em torno da mesa, espaço aberto a todos que aceitam o convite (Mt 22.1-14), é lugar de reconciliação, diálogo e partilha (Mc 6.30-44). Lembra a comunhão de Deus com o seu povo pela a ação de Jesus, que, rememorada na ceia, nos torna um só corpo a partir do pão (verdadeiro corpo de Cristo) e do cálice (verdadeiro sangue de Cristo) dado em nosso favor. Portanto, a Ceia do Senhor nos remete à comunhão, à unidade, onde somos alimentados, fortalecidos, por uma mesma comida e bebida e remetidos a cuidar uns dos outros, cientes que o nosso próximo faz parte do mesmo corpo, da mesma família e do mesmo sacerdócio. O cálice comum reforça este ensinamento. Somos iguais, bebemos do mesmo cálice, sinal da nova aliança (Mt 26.27-29). Existem reações adversas à prática de beber no mesmo cálice por medo de contágios ou repugno de um cálice usado por todos, mas há maneiras de celebrar a ceia sem perder este significado de comunhão: copos individuais ou intinção (mergulhar o pão no cálice). É necessário que estes copos individuais não percam o referencial com o cálice coletivo sobre a mesa da ceia durante a consagração. Há que se ter dignidade na forma de realizar a ceia e no cuidado com os utensílios usados.
                                                                                Para refletir, leia 1 Coríntios 11.17-34

Vinho ou suco de uva?
Pastor Helio Adolfo Doss

   Fico feliz que este assunto seja abordado neste espaço. Em conversa com muitas pessoas, tenho ouvido queixas de que algumas se sentiam excluídas da Santa Ceia porque não queriam ingerir bebida alcoólica. É do conhecimento de todos nós que cada vez mais pessoas são acometidas de estresse e depressão. Estas pessoas tomam antidepressivos e tranqüilizantes, medicação que não combina com bebida alcoólica. Além disso, também é de conhecimento público que há muitos membros das nossas Comunidades que são doentes alcoólicos em recuperação. Isto é, estas pessoas não podem ingerir bebida alcoólica sob pena de recaírem. É por este motivo que estes membros se sentiam excluídos, pois o vinho contém álcool. Vejo na adoção do suco de uva um gesto de amor e solidariedade. No Sínodo Uruguai, foi aprovada em Assembléia a recomendação do uso de suco de uva nas Santas Ceias, mas sabe-se que há resistência de algumas pessoas quanto a isto. Assim sendo, sugerimos que sejam adotadas as duas possibilidades: suco e vinho. Santa Ceia é para a vida e não para a morte, por isso quero animar os Presbitérios a refletirem sobre estas possibilidades, visto que o alcoolismo é uma doença incurável e que leva milhares de pessoas à morte todos os anos. Urge nos lembrarmos do grande Mandamento do Amor. Para dirimir quaisquer dúvidas, dirijam-se aos grupos de apoio, como Alcoólicos Anônimos ou outros do gênero. Também me disponho a contribuir, caso for solicitado, pelo telefone 49 8802.0727 e pelo e-mail helioadolfodoss@bol.com.br.
                                                                                    Para refletir, leia Mateus 22.34-40

Pão e hóstia, qual a diferença?

Pastor Eloir Carlos Ponaht

   Tradicionalmente, em nossas Comunidades, usamos a hóstia nas celebrações da Ceia do Senhor. Porém, em muitas celebrações é utilizado o pão caseiro. Qual é a diferença? É importante saber que hóstia é pão. A hóstia é sem fermento e está ligada ao fato de que, na instituição da Ceia, Jesus usou este pão (sem fermento), pois era época da ‘Festa dos Pães sem Fermento’ ou ‘Pães Asmos’ (Mt 26.17-30). Por outro lado, para nós, evangélicos de confissão luterana, importa o fato de que Jesus não se utilizou de algo que estava fora do contexto ou fora do alcance das pessoas comuns. Ele usou o pão diário, com o qual as pessoas se alimentam. Ele usou o pão que estava na mesa. Com isso, Ele se revela a nós como o alimento diário para a pessoa cristã, o alimento para a nossa fé. Jesus diz: Eu sou o pão da vida (Jo 6.35). A pergunta deveria ser Existe diferença entre pão e hóstia? Na forma, na preparação e no nome, sim. No entanto, para a celebração da Ceia do Senhor, ambos nos fazem perceber o Corpo de Cristo, que é dado em favor de nós, que Nele cremos (Lc 22.19). Nas primeiras comunidades cristãs, a Ceia do Senhor era uma refeição completa, que tinha como marca a partilha (At 2.46). O partir do pão, aquele pão com o qual nos alimentamos, vem a ser o centro da vida da comunidade. Por meio do pão e do cálice, fraternalmente partilhados, recebemos o Cristo vivo, ressurreto: que sustenta a fé, que conduz para a reconciliação, que anuncia e concede o perdão e que desperta para o testemunho em ações concretas no dia-a-dia. Este é o pão da vida oferecido a nós em Jesus Cristo.
                                                                                          Para refletir, leia Atos 2.42-47


As crianças e a Santa Ceia!
Pastora Tânia Cristina Weimer

   Nos primeiros tempos da igreja cristã, as pessoas eram admitidas à Ceia do Senhor imediatamente depois de batizadas. Quando o Batismo passou a ser de crianças (século V em diante), manteve-se essa prática. Com o Batismo, a pessoa é incorporada no corpo de Cristo, que é a sua igreja (1Co 12.1-13 e Gl 3.27), e, por meio desse Batismo, participa da morte e ressurreição de Jesus (Rm 6.4 e Cl 2.12). Jesus reúne a sua comunidade toda em um só corpo, doando-se a si mesmo. No Concílio realizado em 1990, constava em uma das atas que não podemos afastar as crianças da Ceia sob o argumento de que não tenham atingido o grau de fé dos adultos ou que já tenham na palavra pregada toda a dádiva que a Ceia oferece. Tais argumentos dão maior valor à razão que ao Espírito Santo. Para Jesus, as crianças são tão capazes de receber o Reino de Deus, que Ele as coloca como exemplo para seus discípulos. Receber o Reino não depende da capacidade cognitiva da pessoa, mais importantes são a fé, a receptividade e a humildade. Lutero, ao falar em culto na comunidade, disse que se dirigiam à mesa da comunhão ‘homem, mulher, jovem, velho, senhor, escravo, esposa, empregada, pais, crianças, como Deus ali a todos reúne’. Uma das coisas que as pessoas querem saber é o que a Bíblia diz, por isso é importante explicar bem que, na Bíblia, não há argumentos contrários à Santa Ceia para crianças. O texto de Atos 2.42 e Atos 20.7 mostra que a Ceia era celebrada regularmente, sempre que os cristãos se reuniam e acreditava-se que, das crianças, vinha o perfeito louvor (Mt 21.15-16).
                                                                                     Para refletir, leia Marcos 10.13-16

Deus nos conhece completamente.
2Coríntios 5.11
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