A autoridade da Bíblia recebe singular reforço pela afirmação de sua inspiração. Na verdade, a Bíblia não teria autores, e, sim, um só autor, o próprio Espírito Santo. Seria ele quem por ela se manifesta. Com efeito, se é verdade que a Bíblia é a palavra do trino Deus, ela necessariamente é palavra do Espírito Santo, assim como é palavra de Deus Pai e de Jesus Cristo. Nos textos bíblicos se faz sentir o sopro do Espírito divino. A própria Escritura o confirma. Diz a passagem de 2 Timóteo 3.16: “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino (...)”. Algo semelhante lemos em 2 Pedro 1.21. As pessoas, autoras dos textos bíblicos, escreveram movidas pelo Espírito Santo. A existência da Bíblia, pois, não se deve à decisão de alguma instância humana. Ela nasceu por iniciativa do Espírito. Nisto há consenso na cristandade.
A ideia da inspiração de textos sagrados não é nenhuma invenção cristã. Já a encontramos no antigo judaísmo. A primeira cristandade a acolheu, aplicando-a a toda a Bíblia, incluindo o Novo Testamento (NT). Permaneceu controvertido, porém, o modo de entender. Como imaginar “inspiração”? Ora, caso se queira dizer que os autores da Bíblia escreveram sob o impulso do Espírito, não o que discutir. É claro que por trás da vontade de escrever estão a fé, o impacto do evangelho, a motivação do Espírito Santo. Também quando se pensa no conteúdo da Bíblia, não há como contestar que se deve atribuí-lo a Deus. Quem escreve são pessoas que viram e ouviram (1 João 1.1), que falam de suas experiências com Deus, que expõem as razões de sua fé e esperança. O conteúdo da Bíblia não é produto de especulação humana. É testemunho da obra de Deus.
Problemática é a inspiração verbal. Ela atribui ao Espírito Santo não só a vontade de escrever o conteúdo. Atribui-lhe até mesmas a redação, a formulação das palavras. Os autores e as autoras da Bíblia teriam escrito como estando “fora de si”, como meras “canetas” ou “impressoras” do que o Espírito lhes ditou. Tal compreensão deve ser rejeitada. Ela nega aos redatores a qualidade de testemunhas e isto é antibíblico (cf. Atos 1.8). A mente dos autores da Bíblia não se apagou ao escreverem seus textos. Falam da vontade de Deus, de sua promessa, falam de Jesus de Nazaré, do evangelho. Mas eles o fazem “à sua maneira” e do seu jeito. Não são reduzidos a máquinas. Permanecem testemunhas.
Assim se explica a diversidade do testemunho bíblico. Deus fala, sim, mas indiretamente, através da boca de gente concreta, com fisionomia própria, condicionada pelas circunstâncias de seu tempo e de seu ambiente. Por trás dos textos bíblicos estão pessoas de carne e osso, profetas, apóstolos, testemunhas muitas vezes anônimas. Mas o Espírito que as faz escrever é o mesmo (1 Coríntios 12.4). É ele quem está na origem dos depoimentos constantes na Bíblia, quem une a diversidade e quer comunicar-se. Por isso mesmo, inspiração compromete com a busca do Espírito por trás da letra. Importa auscultar o que ele diz às igrejas (Apocalipse 2.7). Quem ainda não percebeu o sopro de Deus na Bíblia ainda não a leu devidamente.
Pastor Dr. Gottfried Brakemeier, em “Por que ser cristão?”, Editora Sinodal
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