Já temos uma longa história no Brasil. Por diversas décadas, a Missão aos Marinheiros desenvolve um serviço de assistência aos marítimos que vêm ao porto de Santos (SP). Nosso trabalho visa a dar suporte à dignidade dos marítimos, prestando auxílio sem discriminação de raça, sexo, cor, nacionalidade e religião, através de serviço de assistência social, psicológica e pastoral. Somos uma organização diaconal ligada à IECLB e a Deutsche Seemannsmission de Bremen.
Nosso trabalho é ecumênico. Trabalhamos junto com a organização Stella Maris, ligada à Igreja Católica e dirigida pelo padre Samuel Torres Fonseca, com o apoio de vários funcionários e colaboradores. Na Missão aos Marinheiros trabalham o pastor Adelar Schünke, o capelão Milton Klaesener, a psicóloga Vera Lúcia Costa Lima, o voluntário Jonas Hermes, da Alemanha, e outros colaboradores. A assistência social, pastoral e psicológica é realizada e prestada no próprio centro, nos navios e em hospitais.
A Missão aos Marinheiros procura ser uma casa longe de casa para todos os marítimos. Estamos de portas abertas para receber a todos, mas não só isso: vamos também ao encontro dos marítimos quando os visitamos a bordo dos navios e nos hospitais e os convidamos para nos visitar. O trabalho em navios é muito difícil. Os tripulantes enfrentam várias dificuldades, convivem em um mesmo navio às vezes com colegas de seis ou mais países diferentes por longos meses e quando não tem concidadãos não conseguem falar a própria língua. Também enfrentam a exploração financeira, tanto a bordo quanto em terra, longas jornadas de trabalho, o desligamento de familiares, amigos e da terra natal, o confinamento, a impossibilidade de lazer, esporte e contato social mais amplo, as doenças, depressões, má alimentação, alteração brusca de temperaturas (no Brasil pode estar 38º graus, mas na Finlândia, 25º graus negativos).
A visão romântica do marinheiro, namorador e conquistador, está restrita aos filmes. Já eram os tempos em que os navios permaneciam dias no porto e o marinheiro tinha tempo para ir aos bares e encontrar uma namorada. Hoje, a maioria dos navios permanece no porto apenas algumas horas. Muitos marinheiros são casados, têm filhos e fazem um enorme sacrifício de ficar longo tempo fora para poder sustentar a família. Já testemunhamos casos em que o marítimo conheceu o filho/a recém nascido pela Internet ou em que familiares faleceram e o marítimo toma conhecimento somente depois de semanas e não tem a mínima oportunidade de estar no sepultamento. O Porto de Santos é o maior da América Latina. Diariamente, ali, atracam cerca de 15 navios, aproximadamente 5.500 por ano. A tripulação de cada navio é em média de 23 a 25 tripulantes.
Nós, da Missão aos Marinheiros e Stella Maris, realizamos diariamente visitas aos navios, de seis a oito por dia – são cerca de 2.800 visitas anuais, atendendo uma média de 6 mil tripulantes por ano. Caso alguém queira obter mais informações sobre o nosso trabalho ou nos conhecer pessoalmente, entrem em contato ou venham nos visitar na Av. Washington Luiz, 361, Boqueirão – Santos – SP – Brasil, CEP. 11055 – 001, e-mail: santos@seemannsmission.org, Tel/Fax: (+55)(13) 3224-2880, Cel.: (13) 9142-7748. (Pastor Adelar Schünke)
Greve a bordo do navio CSCL Kelang
No dia 19 de maio de 2008, por volta da 21h30min, eu estava no trânsito e recebi uma chamada telefônica de um celular das Filipinas: era de um marinheiro. A conexão estava muito ruim e não consegui entender o que o ele queria; depois de alguns segundos, a conexão caiu. Pude entender que ele era do navio CSCL Kelang e que eles estavam com um grande problema a bordo.
Fui para Missão aos Marinheiros verificar na Internet onde estava o navio, mas não consegui encontrá-lo na lista de navios atracados. Ainda não estava no porto e a previsão de entrada era 22h30min. Não havia o que fazer. Como trabalho durante o dia, fui para casa e decidi ir a bordo no dia seguinte. Mais tarde, por volta das 23h50min, recebi outra ligação do navio CSCL Kelang. Era novamente um marinheiro filipino. Ele estava muito preocupado e impaciente e pediu que fôssemos imediatamente a bordo. Perguntei o que havia acontecido, ele apenas disse que estavam com muitos problemas, que precisavam de nossa ajuda urgentemente e que deveríamos contatar também o Inspetor do ITF (International Transport Workers' Federation). Eu insisti para que desse mais detalhes e ele apenas dizia que era urgente e que alguns marítimos precisavam ir ao hospital. Comentei que eu e o inspetor do ITF (sr. Reinaldo) iríamos a bordo no outro dia pela manhã e de qualquer forma não poderíamos resolver os problemas naquele horário. Imaginei que tivesse acontecido alguma briga a bordo, talvez alguém estava gravemente ferido ou havia sido assassinado. Entrei em contato com a Polícia Federal pois eles sempre vão a bordo dos navios para fazer a inspeção, mas neste navio eles não estiveram a bordo e disseram que ele não tinha dado entrada na lista do controle portuário. Não havia muito que fazer e voltei para cama.
Ao redor 24h30min, recebi nova chamada do navio, insistindo para que fôssemos a bordo. Comentei que eu iria, mas que levaria em torno de uma hora uma vez que o navio estava do outro lado do canal e era necessário atravessar a balsa. Quando cheguei na balsa, percebi que ela estava inoperante devido a forte neblina. Assim não havia o que fazer. Voltei para casa e tentei entrar em contato com o navio, porém não consegui. Por volta da 1h30min recebi novamente uma ligação e expliquei o que havia acontecido e que definitivamente somente seria possível ir a bordo no outro dia pela manhã. As 5h30min ligaram novamente e às 7h chegamos a bordo. Foi uma longa noite. Chegando lá vimos duas bandeiras onde estava escrito: Nos apóie!! Nos ajude por favor!! Nós estamos em greve. ITF por favor venha agora, e no outro: Nos apóie, nós estamos em greve!! ITF ajude-nos!! Havia uma grande confusão a bordo. Todos os tripulantes filipinos estavam em greve. Fomos para o refeitório ver e ouvir o que havia acontecido. Eles começaram a falar sobre os problemas. Alguns dos marinheiros estavam trabalhando muitas horas por dia, às vezes 20 horas sem descanso. Alguns estavam doentes porque entraram em contato com um produto químico que vazou de um tanque. Um dos cadetes teve um acidente a bordo, pois estava trabalhando sozinho no deck, numa atividade para a qual não havia sido treinado. Nenhum deles obteve assistência médica no último porto em que estiveram. Também havia reivindicações sobre os pagamentos: não estavam recebendo as horas extras.
Depois de uma longa conversa entendemos o que estava acontecendo e Reinaldo solicitou todos os documentos e contratos da tripulação. Entramos em contato com o capitão e os oficiais. Todos estavam muito irritados porque o navio não pôde operar. Eu e Reinaldo ressaltamos que o principal problema no momento não era a operação do navio, mas que em primeiro lugar seria necessário chamar um médico para fazer uma verificação de quantos precisariam ser medicados ou até hospitalizados. Esse foi o primeiro procedimento tomado. Depois, começamos a resolver todos os problemas de ordem trabalhista e após uma conversa muito tensa e longa chegamos a um entendimento. O capitão redigiu uma carta de compromisso com cópia para toda a tripulação. Reinaldo também ficou de informar o inspetor do ITF do porto de destino do navio na Argentina. Ao redor das 14h a tripulação encerrou a greve e o navio começou a operar. O médico ficou de vir a bordo às 15h. Todos que não estavam bem de saúde ficaram aguardando a sua chegada e os demais foram dormir e todos nos agradeceram muito pela visita e toda ajuda prestada. (Pastor Adelar Schünke)