Fala do Secretário Geral do CONIC Re. Luiz Alberto Barbosa na cerimônia de Lançamento do material da Campanha da Fraternidade Ecumênica 2010 - Rio de Janeiro – 10/09/2009
Caro Presidente do CONIC, Presidentes de nossas Igrejas-membro, Diretoria, autoridades religiosas, civis e militares, senhoras e senhores.
Com muita alegria estamos aqui, aos pés do Cristo, nosso Redentor, apresentando a toda a sociedade brasileira, o material da Campanha da Fraternidade Ecumênica 2010. A Campanha deste ano de 2010 é promovida em conjunto pelas Igrejas que fazem parte do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil – CONIC, como aconteceu em 2000 e 2005. Pela terceira vez temos uma Campanha da Fraternidade Ecumênica. O que move as Igrejas a agir é a graça, o amor de Deus e o testemunho de sua fé em Jesus. As palavras de Jesus Cristo – “Nisto todos reconhecerão que vocês são meus discípulos: no amor que tiverdes uns para com os outros” (Jo 13,35) – ecoam hoje no coração dos seus seguidores, que agem em resposta à missão que lhes vem de Deus em Cristo: a de serem testemunhas da fraternidade, justiça e paz sobre a terra.
Tendo em vista o cumprimento desta missão, a Comissão Organizadora da Campanha, em maio de 2007, ouvindo as bases das igrejas, dos movimentos sociais e da sociedade em geral, teve a árdua tarefa de escolher o tema e o lema da Campanha da Fraternidade Ecumênica. Como uma antecipação profética da crise global econômico/financeira que se abateu sobre o mundo particularmente em 2008, cujos reflexos ainda estamos vivendo e que com certeza os efeitos se prolongarão ainda pelos anos vindouros, a comissão escolheu o tema: Economia e Vida e o lema “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24) A CFE em como objetivo geral: “Colaborar na promoção de uma economia a serviço da vida, fundamentada no ideal da cultura da paz, a partir do esforço conjunto das Igrejas Cristãs e de pessoas de boa vontade, para que todos contribuam na construção do bem comum em vista de uma sociedade sem exclusão”. É necessário conclamar a todos e todas paraconstruir uma nova sociedade, educar essa mesma sociedadeafirmando que um novo modelo econômico é possível, e denunciar as distorções da realidade econômica existente, para que aeconomia esteja a serviço da vida.
O texto-base desta campanha, hoje aqui apresentado inverte a lógica inicial do tema, que é Economia e Vida, o texto base parte da premissa de que a vida está em primeiro lugar. Movido pela fé em Deus, “que ama a justiça e a equidade; a terra está cheia da fidelidade do Senhor” (Sl 33,5), o CONIC não quer limitar-se a criticar sistemas econômicos. Principalmente, espera que a campanha mobilize igrejas e sociedade a dar respostas concretas às necessidades básicas das pessoas e à salvaguarda da natureza, a partir da mudança de atitudes pessoais, comunitárias e sociais, fundamentadas em alternativas viáveis derivadas da visão de um mundo justo e solidário.
O primeiro conceito que somos chamados a refletir nesta campanha é o de que o sistema econômico deve visar o Bem Comum. O Bem Comum abrange a existência dos bens necessários para o desenvolvimento da pessoa e a possibilidade real de todas as pessoas de ter acesso a tais bens. Isso requer o empenho social e o desenvolvimento de grupos e das pessoas individualmente, implicando a existência de paz, estabilidade e a segurança de uma ordem justa. Ao participarem em conjunto desta Campanha, as Igrejas ganham força para pedir às diferentes instâncias da sociedade que também se unam pelo bem comum, na defesa da Vida, como valor mais importante do que os interesses do mercado. Esta campanha procura mostrar o ideal de justiça econômica que sirva e sustente a vida só poderá tornar-se realidade pela ampliação do exercício da democracia e se forem estabelecidas também metas para se atingir a plena sustentabilidade. Para se atingir os objetivos da CFE 2010, são adotadas as seguintes estratégias:
• Denunciar a perversidade de todo modelo econômico que vise em primeiro lugar o lucro, sem se importar com a desigualdade, miséria, fome e morte.
• Educar para a prática de uma economia de solidariedade, de cuidado com a criação e valorização da vida como o bem mais precioso.
• Conclamar as Igrejas, as religiões e toda a sociedade para ações sociais e políticas que levem à implantação de um modelo econômico de solidariedade e justiça para todas as pessoas.
Senhoras e Senhores, recebemos os bens para a vida e não a vida para a riqueza. “Está escrito: Não só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4,4). Como seguidores de Jesus Cristo e partícipes da vida social, somos chamados a construir uma justiça econômica maior diante da persistência da indigência, da pobreza e das grandes desigualdades sociais. Toda a vida econômica deveria ser 26. orientada por princípios éticos. A medida ética fundamental para qualquer economia é um sistema que deveria criar reais condições de segurança e oportunidades de desenvolvimento da vida de todas as pessoas,desde os mais pobres e vulneráveis. Em contraposição, a discussão dominante nas recorrentes crises do capitalismo se restringea estas questões: “Que correções importa fazer para salvar o capitalismo e regular os mercados? Quanto posso ganhar com o menor investimento possível, no lapso de tempo mais curto e com mais chances de aumentar o meu poder de competição e de acumulação?” Não importa se isso leva à destruição da natureza e torna sistêmica a miséria de muitas famílias. A economia não é uma estrutura autônoma. Ela faz parte das prioridades políticas. As políticas econômicas e as instituições devem ser julgadas pela maneira delas protegerem ou minarem a vida e a dignidade da pessoa humana, sustentarem ou não as famílias e servirem ao bem comum de toda a sociedade. A sociedade, incluindo a ação governamental, tem a obrigação moral de garantir oportunidades iguais, satisfazer as necessidades básicas das pessoas, e buscar a justiça na vida econômica.
Ao falarmos de justiça econômica também estamos falando da necessidade de todos nós cuidarmos da Criação. O planeta Terra não passa de um grão de areia na imensidão do universo. Mas é um grão de areia habitado, onde pulsa um coração vivo e vibrante. Nele, o ciclo da vida se reproduz há bilhões de anos. É o único planeta conhecido onde a vida viceja exuberante. A mulher e o homem são chamados a habitar essa grande casa, a manter viva a sinfonia da criação, a cuidar, respeitar e conviver com a variedade e pluralidade das formas de vida. O ser humano foi colocado neste planeta como em um jardim do qual deve cuidar. A vida em nosso planeta está ameaçada. Pessoas sem acesso á água, como direito humano e bem úblico, pessoas sem moradia, sem alimentação, sem terra para trabalhar. Uma cultura de consumismo, com um desenvolvimento desequilibrado. Tendo em vista isto, o Conselho Mundial de Igrejas tem chamado as Igrejas e à sociedade a encarar a realidade do mundo a partir da perspectiva das pessoas, particularmente das
pessoas oprimidas e excluídas. Somos chamados a ser comunidades não-conformistas e transformadoras.
O lema desta Campanha da Fraternidade Ecumênica: Mateus 6, 24 “Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro”, nos remete novamente para a necessidade de termos um sistema econômico inclusivo, para todas as pessoas. O lema nos propõe uma escolha entre os valores do plano de Deus e a rendição diante do dinheiro, visto como valor absoluto dirigindo a vida. O problema não é dinheiro em si, mas o uso que dele se faz. É útil como instrumento destinado ao serviço e intercâmbio de bens de uso, mas não pode ser o supremo comandante dos nossos atos, o critério absoluto das decisões dos indivíduos e dos governos. Deve ser usado para servir ao bem comum das pessoas, na partilha e na solidariedade. Nossa atitude diante do dinheiro mostra muito o tipo de pessoa que somos. Por isso Jesus diz: “Onde estiver o teu tesouro, ali também estará o teu coração” (Mt 6, 21). Se o enriquecimento e a acumulação continuam a ser o sonho de nossa sociedade, os valores se invertem e colocamos em segundo plano a pessoa, sua vida, sua dignidade seu bem-estar. A relação com Deus e todas as demais aspirações humanas acabam por serem rebaixadas a valores secundários. Vemos assim que a acumulação, o não repartir, tem profundas consequências espirituais.
Na história humana, marcada por ambições, explorações, injustiças e ganância, a Bíblia se volta decididamente para a defesa dos pobres: “Não falsificarás o direito do pobre no seu processo” (Ex 23,6). Contra a acumulação da riqueza, que deixa os ricos mais ricos e os pobres mais pobres, Isaías, como outros profetas, dá seu grito de protesto: “Ai dos que juntam casa a casa, campo a campo, até ocuparem todo o lugar e serem os únicos a morar no meio da terra” (Is 5,8). O respeito ao direito do pobre, nos textos bíblicos, é uma exigênciabásica da fidelidade a Deus. Irmãos e Irmãs, Iluminados pelos ensinamentos bíblicos devemos trabalhar as realidades do nosso tempo: direito ao trabalho, à saúde e educação públicas e de boa qualidade, saneamento urbano e outras estruturas que hoje podem promover o bem-estar de todos.
Queridos irmãos e irmãs, as Igrejas do CONIC, ao conclamar as outras igrejas cristãs, outras religiões e as pessoas de boa vontade em geral, para assumirem esta campanha da fraternidade “Economia e Vida”, quer lembrar que a solidariedade faz da humanidade uma família onde todos se protegem mutuamente. Assim problemas que pareciam insolúveis podem ter soluções surpreendentes. A partilha faz milagres. É o que Jesus nos sugere no texto que narra como cinco mil homens mais as mulheres e crianças foram alimentados com cinco pães e dois peixes. (Mc 6,30-44). Os milagres de Jesus têm uma função pedagógica: eles nos convidam a fazer como ele fez, mesmo através de meios bem naturais. Se soubermos partilhar, certamente vai haver pão, casa, cura, saúde, educação e participação para muito mais gente. A pregação de Jesus sobre o juízo final mostra bem que Deus quer ser amado e servido nos pobres: “tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; eu era estrangeiro, e me acolhestes; estava nu, e vestistes-me; doente, e me visitastes; na prisão, e viestes a mim...” (Mt 25,31-40). Graças a Deus, ao longo desta campanha, poderemos nos deparar com milhares e milhares de experiências de solidariedade por todo este país.
A parceria entre a sociedade civil e o governo tem sido de fundamental importância para o exercício de uma solidariedade transformadora. Mas existe muito mais a ser feito, conceitos e projetos a serem mudados, com o Estado assumindo de fato o seu papel fundamental de solução dos problemas sociais. A ação do Estado e do direito não pode excluir os mais fracos, é importante que os governantes ouçam os diferentes setores da sociedade, não só aqueles que costumeiramente têm poder de pressão. 2010 é um ano muito importante para o Brasil, um ano eleitoral, em que elegeremos um novo Congresso e um novo Presidente ou Presidenta. Como Sociedade e como Igrejas devemos estar vigilantes, defendendo a vida plena para todos os brasileiros e brasileiras., encontrando modelos alternativos aos que até agora estão vigentes no mercado. Na tradição cristã, não encontramos apenas a caridade de indivíduos ou a generosa solidariedade de comunidades inteiras. Também buscou-se insistentemente soluções alternativas às estruturas econômicas injustas: criação de hospitais, construção de escolas, organização de economia comunitária, organização de sindicatos e partidos. Hoje, como no passado, as comunidades cristãs devem se interrogar sobre seu patrimônio, seu uso do dinheiro e seu compromisso com a transformação econômica e social do país.
Irmão e Irmãs, a Campanha da Fraternidade Ecumênica conclama, portanto, Igrejas, religiões e toda a sociedade para ações sociais e políticas que levem à implantação de um modelo econômico de solidariedade e justiça para todas as pessoas. Para alcançar essa meta a Campanha da Fraternidade ecumênica destaca a importância da ação coletiva para a transformação social. O diálogo permanente e a articulação das forças sociais, a colaboração entre Igrejas e sociedade, a formação de militantes, uma política sindical que lute pelos direitos não somente dos trabalhadores empregados, mas dos pobres sem trabalho, sem moradia, sem garantias de sustento para si e suas famílias. A cooperação é urgente em uma sociedade que sofre pelo individualismo e a desarticulação. Hoje é o lançamento oficial de todo o material para que a campanha ganhe as ruas, mas não podemos nos esquecer que o maior subsídio, o maior material que temos somos nós, as pessoas, organizadas nas Igrejas, nos movimentos sociais e na sociedade em geral. O sucesso desta campanha, para mudar o Brasil e a vida de cada um de nós e principalmente das futuras gerações depende do empenho pessoal de cada um de nós. Que Deus nos inspire e nos guarde nesta tarefa. Boa e frutuosa Campanha da Fraternidade Ecumênica 2010: “Economia e Vida”.
Fonte: CONIC