Prédica: Êxodo 24.1-11
Leituras: Isaías 50.4-9a; Filipenses 2.5-11
Autor: Vera Maria Immich
Data Litúrgica: Quinta-feira da Paixão
Data da Pregação: 20/03/2008
Proclamar Libertação - Volume: XXXII
1. Introdução
O texto de Êxodo 24.1-11 dá seguimento à revelação do Sinai em Êxodo 19-23 e mostra a constituição ou confirmação da comunhão de Deus com seu povo. Somente Moisés pode aproximar-se de Deus; os demais devem adorá-lo de longe. Parece-nos que a distância com Deus é mais importante do que a comunhão. Inicialmente é reservada a Moisés uma singular proximidade com Deus. Somente a ele Deus fala face a face. Então Deus não era visível, apenas audível. Na continuidade, um grande grupo de representantes vê Deus sem ter conseqüências negativas, pois predominava o pensamento de que quem vê Deus morre. Essa é uma experiência única no Antigo Testamento: tantas pessoas são dignas de chegar à presença de Deus, de ter uma visão.
A primeira referência bíblica à aspersão do sangue está em Êxodo 12.22. Foi ordenado aos israelitas que pegassem um molho de hissopo, que esse fosse molhado no sangue de um cordeiro sacrificado e aspergido na verga da porta e seus umbrais. Naquela noite, quando o anjo exterminador viesse e visse o sangue no umbral da porta, ele passaria daquela casa sem atingi-la.
O sangue em nossos dias tem uma forte conotação de vida e de sobrevivência. Tantas vezes em nossa comunidade solicitamos doadores de sangue para salvar pessoas que tiveram hemorragias em cirurgias ou outras circunstâncias. No entanto, sabemos que através de contato ou transfusão de sangue contaminado pode-se adquirir enfermidades graves e/ou letais. Portanto, aspergir com sangue hoje está fora de propósito. O que não tira o grande valor que sabemos que o sangue tem para a continuidade da vida. No senso comum, sangue simboliza poder, como indicam várias expressões: esse tem sangue azul ou nobre; quem sai aos seus não degenera; o fruto não cai longe da árvore; selar com sangue; ritos de expiação e oferendas com intenção maligna, e outras que conhecemos em nosso contexto.
2. O texto
Há em Êxodo 24.1-11 uma aspersão de sangue. Nessa passagem, Deus fez um acordo com Israel. Depois que Moisés leu a lei para o povo, eles responderam: “Tudo o que falou o Senhor, faremos, e obedeceremos” (7b). Eles concordaram com o acordo feito com o Senhor. Agora, esse acordo tinha que ser selado. Sua confirmação e validação só poderia acontecer através da aspersão de sangue sobre eles.
O sangue dos novilhos sacrificados foi recolhido. Parte dele Moisés aspergiu sobre o altar e a outra parte, sobre o povo. Esse sangue, ao cobrir o povo, selou o acordo! “Eis o sangue da aliança que o Senhor fez convosco a respeito de todas essas palavras” (8b).
Fica claro na passagem acima que a aspersão do sangue deu aos israelitas pleno acesso a Deus, com alegria. Nessa ocasião, o sangue não tinha nada a ver com perdão e remissão de pecado, mas antes com comunhão. Eles agora ficaram santificados, purificados, preparados para estar na presença de Deus, para ouvi-lo, para vê-lo e para comer com ele.
Depois Moisés, Nadabe e Abiú e os setenta anciãos subiram o monte para se encontrar com Deus. E o Senhor apareceu a eles, vindo por um caminho feito de pedras de safira. Esses homens viram diante deles uma mesa arrumada, sentaram-se na presença de Deus e comeram e beberam com Ele: “Ele não estendeu a mão sobre os escolhidos dos filhos de Israel; porém eles viram a Deus, e comeram, e beberam” (Êx 24.11).
Isso é simplesmente maravilhoso! Esses homens puderam comer e beber na real presença de Deus, considerando que pouco tempo antes eles tinham temido por suas vidas. Tudo porque o sangue foi aspergido e eles entenderam a segurança, o poder, a proteção que havia nele. Eles não tiveram medo!
3. Leituras bíblicas
O texto de Mateus 26.36-56, que é uma das leituras indicadas para este dia, mostra-nos Jesus preparando-se para enfrentar seu martírio, sua morte e morte de cruz. Seu sangue também será derramado e a aliança será firmada para todo o sempre. Em um dos textos anteriores, Jesus celebra e institui a Santa Ceia: “A seguir, tomou um cálice e, tendo dado graças, o deu aos discípulos, dizendo: Bebei dele todos; porque isto é meu sangue, sangue da nova aliança, derramado em favor de muitos, para a remissão de pecados” (Mt 26.27-28).
O texto de 1 Coríntios 10.16-17 destaca a importância da comunhão com o corpo de Cristo através da Ceia, através do cálice da bênção que abençoamos e do pão que partimos em seu nome. Quem participa dessa comunhão torna-se um só corpo. Essa comunhão vence as diferenças culturais e contextuais. Não há mais hierarquias, empregados ou patrões, ricos ou pobres, brancos ou negros, mas todos se achegam a ele formando um só corpo, que é a sua comunidade, a sua igreja.
4. A pregação
Quinta-feira da Paixão remete-nos à data mais relevante do calendário litúrgico da igreja e de nossa vida de fé. A Semana da Paixão suscita em nós muitos sentimentos diferentes. Os filmes sobre o ministério de Jesus e sua morte e ressurreição nos diversos canais de televisão fazem até mesmo as pessoas que não freqüentam uma comunidade pensar sobre a questão.
A pregação, baseada no texto de Êxodo, pode resgatar a importância do sangue em nossa vida e cultura, do sangue que é a própria vida, pois de hemorragia se morre, de anemia e leucemia também, mas da vida/sangue dado por Jesus Cristo em nosso favor ressurgimos dentre os mortos, porque Cristo venceu a morte ao doar-se completamente.
O altar que Moisés erigiu é um altar para sacrifício a Deus. Uma forma de achegar-se a Deus, de agradá-lo, de firmar uma aliança, um compromisso de fidelidade, um compromisso de sangue. O ritual do sacrifício realizado por Moisés resulta no sangue aspergido sobre os convidados, o povo de Deus.
A pregação deve ser permeada pelo último e grande sacrifício realizado por Jesus Cristo, que se fez ponte para nos ligar ao Pai de forma definitiva. Todas as vezes que, em obediência à ordem de Jesus, celebramos a Ceia comunitariamente, reafirmarmos que esse é o sangue da nova aliança, inaugurada por Jesus. Como seu povo, reafirmamos nossa fidelidade: “Tudo o que falou o Senhor, faremos”. Como seu povo, permitimos que Deus venha até nós para que vivamos de sua comunhão plena e profunda.
O pregador poderá enumerar alguns pontos, desenvolvê-los e retomá-los, visto que facilita a atenção do ouvinte:
a) Significado da aliança de Deus com seu povo ontem e hoje.
b) Ajoelhar-se e adorar. Atitude de Moisés e do seleto grupo de anciãos e logo também do povo. Como nós hoje louvamos e adoramos Deus em nossas meditações individuais, em pequenos grupos ou em comunidades?
c) Moisés é um líder transparente. Ele conta tudo ao povo. Colabora com seu processo de amadurecimento na fé. Que tipo de lideres espirituais somos nós?
d) Eles celebram juntos. Juntos recebem a bênção de proteção de Deus. Como celebramos juntos? Vivemos da graça e da bênção de Deus?
5. Auxílios litúrgicos
Para o culto de Quinta-feira da Paixão sugiro uma oração e uma bênção de Luiz Carlos Ramos:
Oração:
Ó, tu que salvas o corpo da morte
E a alma das trevas:
Recebe o louvor que ofereço
Do fundo deste corpo sacrificado, mas vivo.
Permite que esta carne corruptível te seja santa;
Que meu canto tímido te seja agradável.
E habitarei os teus altares para sempre;
Pois sou todo teu, de corpo e alma.
Amém.
Bênção:
Que a Força que abriu o sepulcro
Nos abençoe em nossas fraquezas;
Que o Amor que venceu a morte
Nos ajude a vencer a indiferença;
Que a presença do Consolador
Nos faça dormir tranqüilos e acordar em paz.
Vão na paz do Senhor e sirvam a ele com alegria.
Amém!
Bibliografia
SCHMIDT, Werner. A fé do Antigo Testamento. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2004.
DOMAY, Erhard. Gottesdienst Praxis Série B – Passion. Gütersloh, 2002.
ALVES, Rubem. CultoArte. Celebrando a vida. Quaresma e Páscoa. Editora Vozes, 2001.