“Que a graça do nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus Pai e a comunhão do Espírito Santo esteja com vocês”
Hoje em dia, quando tantas pessoas tem um celular na mão, dificilmente alguém fica parado, sentado, observando o movimento das pessoas ao redor. Houve um tempo quando o mundo era diferente: não havia rede de internet para conectar e as pessoas olhavam ao redor, às vezes até mesmo conversavam umas com as outras.
É esta ocasião em que encontramos Jesus dentro do templo, junto com seus discípulos. Ele está olhando o vai e vem das pessoas, especificamente Jesus está observando as diferentes pessoas que trazem seu dinheiro para depositar na caixa de ofertas do templo. Muitas pessoas passam diante de Jesus, mas apenas uma lhe chama a atenção o suficiente para dizer aos discípulos, “as outras pessoas deram do que lhes estava sobrando. Ela, porém, que é tão pobre, deu tudo o que tinha para viver” (Mc 12.44).
Entre tantas pessoas, quem chama a atenção de Jesus é uma pobre viúva que, do ponto de vista financeiro, ofertou somente duas moedinhas de pouco valor. É esta pobre mulher quem ganha destaque e é elogiada por Jesus. O que significa esta história? O que Jesus está nos ensinando ao elogiar e destacar esta pobre viúva em meio à tanta gente? E quantos de nós nos identificamos com esta pobre viúva? Quem entre nós vive em situação de vulnerabilidade como esta pobre viúva? Será que nós também precisamos ofertar tudo o que temos para receber um elogio de Jesus? Além disso, pensando em nosso contexto - onde charlatões se aproveitam da fé e do sofrimento das pessoas para vender falsas promessas – o que esta história bíblica significa? Jesus está apoiando que pessoas sejam roubadas de seus recursos necessários para viver?
Na terra de Jesus, uma mulher viúva e pobre não tem uma vida fácil. Uma mulher viúva, que perdeu seu marido, não tem direito à herança e, às vezes, não pode contar com a ajuda de seus familiares. A situação é mais complicada ainda quando a mulher não tem filhos; ou quando tem e são crianças pequenas – isto se traduz em mais bocas para alimentar. Se a família de seu marido é pobre, a mulher é considerada um fardo extra. E se a intenção é retornar à sua família de origem, estes teriam de pagar um valor para a família do falecido marido. Tal é a situação de vulnerabilidade que muitas mulheres viúvas e pobres tem de enfrentar nos tempos e na terra de Jesus.
Uma instituição, entretanto, lhes está disponível para lhes ajudar: o templo de Jerusalém. O templo de Jerusalém, incluindo os sacerdotes e suas famílias, era mantido pelas ofertas. Entretanto, parte das ofertas recolhidas no templo são destinadas especificamente para ajudar as mulheres viúvas e as crianças órfãs. Estas ofertas recolhidas e repartidas são consideradas como vontade de Deus expressa na lei judaica, como, por exemplo, “O SENHOR Deus diz, ‘Sempre haverá pessoas pobres e necessitadas no meio do povo, e por isso eu ordeno que vocês sejam generosos com todos eles’” (Dt 15.11 - este texto em DT faz parte do bloco de instruções quanto ao culto. Veja também o livro de E. P. Sanders, “Judaism: practice and belief). As ofertas recolhidas e repartidas no templo são um reconhecimento que todos os bens e todos os dons vêm de Deus e que nós somos apenas administradores e administradoras destes dons e bens. No fundo, é um reconhecimento que nada nos pertence, que recebemos os dons para promover vida digna para todas as pessoas. A partilha das ofertas do templo, portanto, é um tipo de previdência social do mundo antigo, um tipo de INSS que protege e garante o futuro das viúvas e crianças órfãs. A partilha das ofertas do templo, portanto, é uma expressão de espiritualidade, um gesto de confiança no Deus que ampara e dá o sustento e que nos chama para, na medida do possível, repartir o que temos com outras pessoas.
A viúva pobre, destacada e elogiada por Jesus, está vivendo justamente esta espiritualidade, a espiritualidade da partilha, da fé no Deus que aproxima as pessoas para comunhão e serviço mútuo. Mesmo sendo pobre, a mulher viúva coloca seus dons à serviço, no caso, coloca sua oferta à disposição para ajudar outras pessoas em necessidade.
A viúva pobre, entretanto, não é a única pessoa que ganha destaque na história bíblica hoje. Momentos antes, também dentro do templo, Jesus destaca e adverte o povo para terem cuidado com os mestres da lei. Os mestres da lei são pessoas que conhecem bem a lei judaica e a ensinam ao povo. O comportamento de alguns mestres da lei, porém, é reprovado por Jesus: são pessoas que gostam de roupas suntuosas como capas longas, de serem reconhecidos e cumprimentados nas praças públicas, de sentar nos primeiros bancos, lugar de honra nas sinagogas e banquetes festivos. E como se toda esta bajulação e louvor próprio não fossem suficientes, ainda entram nas casas das mulheres viúvas para oferecer longas orações em troca de dinheiro! Em outras palavras, são pessoas mais voltadas para elas mesmas do que voltadas para as outras pessoas. Mais importante do que colocar dons à serviço é seu status social, sua sede de poder, sua ambição para dominar e até mesmo explorar outras pessoas.
É a partir deste contraste entre a viúva pobre e os mestres da lei que as palavras de Jesus trazem luz para nós. A diferença entre a viúva pobre e os mestres da lei, ambos destacados por Jesus, tem a ver com comunidade, comunhão, serviço e amor ao próximo, espiritualidade da partilha, da fé no Deus que aproxima pessoas. No final das contas, não é a quantidade de moedas que a viúva pobre colocou na caixa de ofertas do templo que verdadeiramente importa, mas sim a sua fé e motivação para ofertar e contribuir. A fé da viúva pobre está firmada no Deus que ampara e dá o sustento e que nos chama para, na medida do possível, repartir o que temos com outras pessoas. A motivação da viúva pobre é contribuir, dentro de suas possibilidades, para a comunidade – repartir vida para que outras pessoas também tenham vida.
Assim sendo, as palavras de Jesus nos desafiam como igreja e sociedade a viver a espiritualidade da partilha, a espiritualidade da comunhão e do serviço ao próximo. E como comunidade cristã, muito além da lei judaica que nos ordena à generosidade, temos Jesus que é a oferta generosa de Deus em nosso favor. Jesus, sendo rico na presença de Deus Pai, se faz pobre ao descer a este mundo, a fim de quebrar o ciclo da ambição para dominar, o ciclo da sede de poder e exploração do próximo. Jesus nos oferta sua própria vida como caminho para uma vida nova. Jesus nos oferta a reconciliação para levantar uma nova comunidade de pessoas, comprometidas em colocar seus dons e bens à serviço do mundo. Neste sentido, a IECLB, incluindo a paróquia de Maripá e suas comunidades, tem a responsabilidade de zelar e administrar bem os recursos financeiros das pessoas que aqui fazem suas ofertas. Pois tais dons e bens não nos pertencem. Pertencem a Deus. Somos administradores e administradoras destes dons e bens, que servem para promover vida digna para todas as pessoas. Que Deus nos dê um espírito de generosidade no ofertar, sabedoria para bem administrar os recursos, fé para confiar no Deus que nos ampara e nos sustenta, e motivação para contribuir na comunhão e no serviço ao próximo. Amém.