Prédica: Salmo 29
Leituras: Mateus 3.13-17 e Atos 10.34-43
Autoria: André Martin
Data Litúrgica: 1° Domingo após Epifania (Batismo do Senhor)
Data da Pregação: 12/01/2020
Proclamar Libertação - Volume: XLIV
Somos filhos e filhas do dono do mundo
1. Introdução
Ano novo, vida nova! Assim ouvimos muitas vezes. Preparando-nos para mais uma celebração, o texto do Salmo 29 quer ser nossa inspiração. No 1º Domingo após Epifania, lembramos o Batismo de nosso Senhor. Jesus foi batizado por João, nas águas do rio Jordão. O texto da pregação, veterotestamentário, não faz alusão direta ao batismo de Jesus, mas, em consonância com as demais leituras propostas, nos dá uma bela indicação do desdobramento do batismo de Jesus e das implicações desse em sua vida e atuação: completa dedicação ao reino de Deus, pois Deus é senhor e soberano sobre tudo e todos. Da mesma forma, é indicativo também para nossa própria vida e da vida em comunidade, haja vista ser o Batismo um dos sacramentos de nossa igreja.
Mateus 3.13-17 é o texto que relata o batismo de Jesus por João Batista. Jesus comenta que precisa ser batizado para que a justiça (dikaiosyne) seja completa. A voz de Deus se faz escutar! Atos 10.34-43 nos mostra, na fala de Pedro, que Jesus Cristo, a quem ele e os discípulos testificam, é o ungido de Deus. A Cristo se reportam todas as profecias. A partir de Cristo, a bênção da paz, exaltada no final do Salmo, torna-se concreta em nosso mundo.
2. Exegese
Consideramos muito interessante as ponderações de Dennis Allan sobre o Salmo 29: “Na leitura desse Salmo, percebemos ênfase especial pela repetição de algumas expressões. Vários estudiosos da língua hebraica falam do significado de palavras repetidas, e sugerem que a tripla repetição seja uma maneira de dar máxima ênfase” (ALLAN, 2019).
Para interpretar o Salmo 29, usaremos a tradução de Almeida, Revista e Atualizada no Brasil (ARA). Das muitas versões em português, também comparando com a tradução de Lutero para o alemão, penso ser essa a mais interessante. Assim segue o texto bíblico do Salmo 29, com uma proposta de estruturação exegética já citada anteriormente: introdução – mensagem central – conclusão.
Introdução
V. 1-2. Tributai ao SENHOR, filhos de Deus,
tributai ao SENHOR glória e força.
Tributai ao SENHOR a glória devida ao seu nome,
adorai o SENHOR na beleza da santidade.
Nesses dois versículos, temos o convite para exaltar a Deus e ao seu santo nome. No v. 1, observamos que a versão de Almeida Corrigida e Fiel traz a expressão “filhos dos poderosos”. Essa expressão não condiz com a versão hebraica. Ambos os versículos convidam para que toda a honra e toda a glória sejam prestadas a Deus. Ele deve ser adorado. O porquê disso vem nos versículos seguintes: Deus se faz sentir e se faz presente em toda a criação.
Mensagem central
V. 3-9. Ouve-se a voz do SENHOR sobre as águas,
troveja o Deus da glória; O SENHOR está sobre as muitas águas.
A voz do Senhor é poderosa; a voz do SENHOR é cheia de majestade.
A voz do SENHOR quebra os cedros;
sim, o SENHOR despedaça os cedros do Líbano.
Ele os faz saltar como um bezerro;
o Líbano e o Siriom, como bois selvagens.
A voz do SENHOR despede chamas de fogo.
A voz do SENHOR faz tremer o deserto;
o SENHOR faz tremer o deserto de Cades.
A voz do SENHOR faz dar cria às corças e desnuda os bosques;
e nos seu templo tudo diz: Glória!
Deus não é visto, mas sua voz se faz sentir e perceber. Reiterando o que já foi exposto no início, a tríplice repetição denota a importância que é dada à voz de Deus. Nada a consegue impedir. Ela é descrita como forças inabaláveis da natureza. Nas forças da natureza, que abalam, despedaçam, fazem tremer, está a voz de Deus.
Conclusão
V. 10-11. O SENHOR preside aos dilúvios;
como rei, o SENHOR presidirá para sempre.
O SENHOR dá força ao seu povo,
o SENHOR abençoa com paz ao seu povo.
Se nos versículos anteriores era ressaltada a força de Deus na natureza, aqui temos o agir de Deus para com seu povo. O salmista evoca o senhorio de Deus frente aos dilúvios. Lembramos que foi o grande dilúvio que arrasou a maldade humana na terra e proporcionou um novo começo com Noé, sua família e os animais salvos na grande arca. Mas também o versículo final é impressionante. O Deus todo-poderoso fortalece seu povo e concede a bênção. A bênção é extraordinária e somente pode vir daquele que tudo controla. A bênção que Deus dá é a paz. Essa paz provém do Deus que é todo-poderoso e que reina para sempre.
3. Meditação
Penso que devemos partir do anúncio de que estamos no domingo em que lembramos o batismo de Jesus Cristo. Especialmente chamamos a atenção para o fato que Jesus, a partir do seu batismo por João Batista, inicia sua missão. Cada vez mais ouvimos a lamúria de que os templos, local em que as pessoas batizadas congregam, buscam inspiração e orientação para a vida, estão se esvaziando. Como podemos reagir a isso? Cremos na santa igreja cristã, que nada mais é do que a comunhão dos santos, as pessoas que foram lavadas do pecado pelo batismo, incluídas em seu Reino, santificadas pelo agir do Espírito Santo, ungidas para servir a Deus e ao semelhante. Como reagimos a isso, haja vista reclamarmos cada vez mais de uma crescente sensação de “cada um por si e Deus por todos”?
Repito o pensamento de Dario Schaeffer no PL suplemento 1: “O Batismo é, então, a expressão central das duas coisas mais importantes na vida do ser humano: o fato de que Deus, em Jesus Cristo, se volta ao homem, aceita-o, perdoa-o e inclui-o em sua obra salvífica e humanizadora e, com isso, em seu Reino, e o fato de que o homem, em fé, sempre de novo se volta para Deus, confessa-se a ele, torna-se obediente unicamente a ele, lhe jura fidelidade e, com isso, se humaniza e se volta ao homem sofredor ao seu lado” (SCHAEFFER, 1987, p. 201). Pergunto: que implicações tem o batismo na minha vida pessoal e comunitária?
É dia de lembrar o batismo de Jesus, mas é dia especial de lembrar também nosso próprio batismo. Nesse aspecto, o Salmo 29 nos dá uma oportunidade muito interessante de abordar o batismo e as implicações desse em nossas vidas.
O Salmo 29, do versículo 1 ao 9, exalta a grandeza e santidade de Deus. Ele nos mostra o exemplo de todas as hostes celestiais que glorificam a Deus. Proclama que Deus é Senhor sobre tudo, sobre toda a natureza. A voz de Deus, que produz maravilhas mundo afora, é a mesma voz que, por ocasião do batismo de Jesus diz: “Este é meu filho amado, em quem me comprazo”. A partir do batismo, Jesus inicia seu ministério. A partir do batismo, Jesus se coloca em obediência àquele que é soberano sobre tudo. A voz poderosa de Deus se fez ouvir, conforme o testemunho de Pedro, pela palavra que veio por toda a Judeia, começando pela Galileia, depois do batismo que João pregou.
Volto-me novamente para o final do Salmo 29. O Senhor dá força ao seu povo, o Senhor abençoa com paz o seu povo. A perícope de Atos mostra, na fala de Pedro, que Deus ungiu Jesus com o Espírito Santo. Jesus andou entre as pessoas fazendo o bem, curando-as e livrando-as das opressões. Pedro termina dizendo que isso tudo é a concretização das profecias. Também essa é a paz com a qual Deus abençoa seu povo.
Somos batizados e batizadas. Somos ungidos e ungidas. O Espírito do Senhor está sobre nós. A voz de Deus se faz ecoar e precisa ser lembrada: “Chamei--te pelo teu nome; tu és meu! Tu és minha!” Que implicações concretas traz essa verdade à minha vida? O batismo mostra-me a grandeza de Deus? Esse Deus grandioso se volta para mim em Cristo e me conclama a ser uma bênção de paz, haja vista Deus abençoar seu povo com a paz? Que Deus esteja acima de todos e abençoe seu povo com paz acima de tudo.
4. Imagens para a prédica
Lembrando as palavras do salmista em consonância com nossa condição de pessoas batizadas, lembrei-me da famosa frase de para-choques de caminhão: “Não sou dono do mundo, mas sou filho/a do dono”. Talvez seja algo com que possamos prender a atenção das pessoas presentes ao culto. Exaltar a grandeza de Deus, o dono do mundo, e chamar a atenção que, pelo batismo, somos filhos e filhas do dono do mundo e que essa condição nos torna corresponsáveis para que a bênção da paz, tão almejada por cada indivíduo, chegue a todas as pessoas.
5. Subsídios litúrgicos
Penso em conduzir toda a celebração para que se estruture tal qual o Salmo previsto para a pregação: iniciando com a exaltação ao senhorio de Deus e seu grande poder; mostrando onde o poder de Deus se faz visível e palpável; finalizando com a conclusão de que tudo o que esse Deus todo-poderoso deseja é abençoar seu povo com paz, não apenas falada, mas sentida, palpável na vivência e convivência comunitária.
– Iniciar a celebração com o hino do LCI 242 – Santo, Santo, Santo.
– Sugerimos, dependendo de como conduziremos a pregação, encerrar com LCI 564 – Abre nossos olhos.
– Como palavra de bênção e envio, sugiro usar uma formulação a partir de Lucas 4.18: “O Espírito do Senhor está sobre ti, ele te unge para pregar boas novas aos pobres. Ele te liberta e te envia para proclamar liberdade aos presos de todos os tipos de prisão e opressão, ele te abre os olhos te envia e a abrir os olhos de irmãos e irmãs que vagueiam na cegueira. Seja mensageiro do Deus altíssimo! Proclame o ano da graça do Senhor”.
– Hino do LCI 263 – Paz, paz de Cristo. Coloco como sugestão para após o momento de bênção e envio.
Bibliografia
A BÍBLIA SAGRADA. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2. ed. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.
ALLAN, Dennis. Salmo 29: A Voz do SENHOR. Disponível em:
GIL’EAD, Enih. Bíblia Interlinear Hebraico-Português. Clube de Autores, 2018.
SCHAEFFER, Dario. O Sacramento do Santo Batismo. In: KILPP, Nelson (Org.). Proclamar Libertação – Auxílios Homiléticos/Suplemento 1. 2. ed. São Leopoldo: Sinodal,1987. p. 199-209.
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