Acabamos de lembrar o Dia da Reforma Luterana; uma reforma na Igreja de Cristo criada em Pentecostes e que teve como uma de suas marcas o incentivo para a música.
Iniciamos falando da música no período do século XVI. Em primeiro lugar é preciso que nos desgarremos totalmente da realidade musical contemporânea. Inclusive os efeitos que ela exerce sobre o nosso ser e sobre nossos sentimentos.
No período que antecedeu a Reforma tudo acontecia de maneira muito diferente. A expressão musical, daquele contexto, era “fria” e distante da realidade do povo. Ela não somente estava distante, como também deixava de exercer boa influência sobre sentimentos e o modo de agir das pessoas. Era usada pela igreja, muitas vezes, como mais um dos recursos de alienação, distanciamento e repreensão. A música em latim, cantada apenas por um pequeno grupo do clero, bem como toda a missa, estava muito distante das necessidades do povo e da sua capacidade de compreensão. Sendo assim, ela não facilitava o acesso nem o entendimento da Palavra às pessoas simples.
Com o movimento da Reforma, especialmente com Luther, a música começa a ser inserida de maneira muito diferente na vida da Igreja. Até aí o povo apenas ouvia, sem entender nada. A partir daí começa a participar ativamente do louvor, da súplica e adoração a Deus com seu canto. Assim, a música torna-se uma ponte viável, um instrumento palpável de aconchego, socorro no diálogo entre povo e Deus. A nova idéia que surge é: Se Deus ouve meu canto, poderá ouvir também minhas orações! Tenho acesso a Deus independente do clero! Isso é extremamente libertador.
A música torna-se um instrumento forte na luta contra a venda indulgências, de relíquias, de romarias, de adorações e começa a ser usada como instrumento libertação. Com isso, ela começa perpassar, instigar e instruir a vida das pessoas simples da comunidade. As pessoas começam a entender que o perdão e a aceitação do ser humano independem das “amarras” que faziam tudo passar pelo clero.
Para Luther, música e teologia estão intimamente ligadas, e é por isso que compôs vários hinos. É por isso que montou também várias polifonias para o trabalho do canto coral e fez comentários profundos para exaltar a música como boa dádiva que vem de Deus e volta para Deus através do nosso canto, da nossa expressão musical.
A música, além de tudo isso que já foi dito até aqui, torna-se instrumento pedagógico de formação na e para fé. Por esses motivos é que precisamos enfatizar, motivar e encorajar à educação musical, com músicas de boa qualidade e que sejam ricas em conteúdo. O desafio é dispor do nosso tempo e investir recursos financeiros para dar suporte a este trabalho dentro de nossas comunidades.
Carl F. Shalk afirma:
“A música [...] guia a pessoa que a pratica em direção a Deus, instruindo-a para um melhor entendimento da palavra de Deus [...] preparando-a a aceitar a graça divina, fazendo dela uma pessoa melhor e um cristão mais feliz, livrando-o do diabo e de todas as maldades”.
A música para Luther é um instrumento de formação, é uma expressão comunitária de louvor, súplica e gratidão que vem de Deus e para Ele volta, mas não sem antes perpassar e tocar cada um/a de nós, com nossas alegrias e tristezas; conquistas e derrotas.
Vivemos novamente um momento em que precisamos rebuscar com audácia, como Luther, e transformar, renovar e reformar o que não está bom dentro de nossas comunidades e de nossas vidas. Música é vida e traz vida em liberdade, aspectos dos quais, muitas vezes, estamos carentes e sedentos. Certamente, ainda hoje, precisamos buscar caminhos para que o canto e a expressão musical encontrem o seu espaço original dentro de nossas comunidades. Que possamos seguir cantando sobre o amor de Deus por nós, revelado em Cristo. Amém.
Fernando José Matias – estagiário de Teologia da EST na Paróquia do ABCD, Santo Andre/SP.